
A
morte de Inês Etienne Romeu, última sobrevivente da Casa da Morte de
Petrópolis, encerra o ciclo da história oral dos que ali foram
torturados. Agora que ela se foi, só nos restam os documentos escritos e
as centenas de depoimentos que ela prestou sobre este triste episódio,
que envergonha a história brasileira.
Obstinada
na busca pela justiça, ela mostrou, a todos os que se dispuseram a
ouvir, até que ponto pode chegar um sistema ditatorial que transforma os
homens em fera e, no dizer da pensadora Hannah Arendt, banaliza o mal ,
transformando a ação bárbara da tortura em um ato de mera rotina
profissional.
O
fato de ter sobrevivido às sessões de tortura e o erro cometido por
seus arrogantes algozes, que esperavam ter dominado sua mente,
julgando-a incapaz de reagir, deu a nossa população as condições de
saber exatamente o que eram os porões da ditadura e a existência desses
centros clandestinos, como a Casa de Petrópolis, onde inúmeros
opositores do regime militar de 1964 foram eliminados.
Inês
Etienne foi incansável na sua vida após a prisão. Devotou o que restou
dela na denúncia dos que participaram de seu sequestro, prisão, tortura e
seviciamento: cobriu todo o país com palestras, e deu importantes
depoimentos às Comissões da Verdade que mais tarde foram criadas.
Mostrou o quanto foi cruel o Sistema ilegal montado por aqueles que se
apropriaram do poder, derrubando um presidente legitimamente eleito, e a
que ponto eles puderam chegar através dessas Casas de Tortura.
Certamente,
trata-se de uma personagem importante na nossa história, honrando uma
geração de jovens utópicos que não tiveram dúvidas em enfrentar um
inimigo poderoso, na busca pela liberdade que naquele momento faltava ao
país.
Oxalá
sua vida e sua morte chamem à reflexão os incautos que acreditam que um
sistema ditatorial pode ser melhor do que a liberdade política que
ainda temos, e expressam tal vontade instigando os militares a se
apropriarem novamente do poder político.
Nenhuma
proposta de avanço econômico ou material pode justificar supressão da
liberdade, em qualquer dos seus níveis, pois nos seus porões os regimes
ditatoriais geram apenas excrescências inumanas – com as quais Etienne
se deparou.
Sabemos que a sua luta não foi em vão e a história não se repetirá.
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