segunda-feira, 31 de maio de 2010

Movimentos sociais articulam plataforma anti-PSDB

São Paulo - Com 2,5 mil pessoas no Centro de São Paulo, a Assembleia de Movimentos Sociais definiu propostas para o país. Apesar de haver a previsão de que o material seja entregue a todas as candidaturas à Presidência da República, sobraram críticas e ataques ao PSDB e ao DEM. Delegações de 20 estados estiveram no evento. Vários dos ativistas qualificaram a assembleia como um momento histórico.

Foram realizadas assembleias em 20 estados para definir as propostas, segundo a Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), organizadora do evento. Nesta terça-feira (1º), a Conferência Nacional da Classe Trabalhadora, no estádio do Pacaembu, também na capital paulista, define plataforma análoga, desta vez por centrais sindicais.

O integrante da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Paulo Rodrigues, fez um alerta endereçado especialmente a jornalistas de veículos de comunicação: "Não viemos aqui fazer comício nem programa de governo da Dilma (Rousseff)." Em seguida, desafiou: "Mas não tenham dúvida de que todos queremos derrotar os tucanos em todas as partes do Brasil."

Em ano eleitoral, centrais querem redução da jornada aprovada até junhoUma lista de 56 itens compõe a pauta dos movimentos. De redução do superávit primário e dos juros básicos da economia até a nacionalização da Petrobras, os itens abarcam até questões internacionais. Há críticas à política externa dos Estados Unidos e manifestação de solidariedade ao povo palestino, além de pedir o fim da prisão de Guantânamo.

Nem todos os pontos defendidos seriam corroborados por um programa de governo da pré-candidata Dilma Rousseff. A defesa do fim do fator previdenciário, aprovado no Congresso e a espera de sanção de Luiz Inácio Lula da Silva é um deles. Diferentes ministros do governo federal defenderam publicamente o veto. A democratização dos meios de comunicação e do Conselho Monetário Nacional (CMN) também seriam pontos que dificilmente fariam parte de um programa oficial.

A assembleia dos movimentos repete um encontro realizado em 2006, quando uma plataforma unitária de propostas foi apresentada aos candidatos. Além dos projetos, o encontro foi voltado a definir um calendário de mobilização para garantir conquistas que "derrotaram o modelo neoliberal e decretaram o fim da Alca (Área de Livre Comércio das Américas)", conforme definiu João Paulo.

Artur Henrique da Silva Santos, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), entende que a assembleia tem importância internacional em um contexto em que os reflexos da crise financeira internacional, que eclodiu em 2008 e 2009, ainda são percebidos em países como a Espanha, Grécia e Itália. "Precisamos mostrar ao mundo o que acontece em nosso continente, a América Latina, quando governos populares e democráticos promovem 'outro desenvolvimento'", defendeu.

O presidente da CUT deixou clara a predileção pela pré-candidata Dilma Rousseff, embora tenha evitado mencionar diretamente o nome da petista. "Precisamos de uma... precisamos de uma... precisamos de uma mulher na Presidência da República", defendeu. "A tentativa do PSDB e do DEM de vencer a eleição é para voltar e repetir o que o PPPP fez: o partido da privatização, do presídio, do pedágio e da paulada em professor", discursou.

O deputado federal Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, presidente da Força Sindical, lembrou que já foi condenado a duas multas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por campanha antecipada, mas não hesitou em reafirmar sua posição. Ele prometeu manter as declarações de apoio à pré-candidata petista, por não ter a mídia para defender suas ideias. Recebido sem entusiasmo pelos participantes da marcha, já que a central sindical não integra a CMS nem tinha delegações, ele saiu aplaudido após críticas ao pré-candidato José Serra (PSDB).

"A direita tenta barrar os avanços dos trabalhadores", afirmou Paulinho. "Podem processar que nós vamos falar. Como esse sujeito vai ser presidente sem dialogar com os movimentos sociais? Se isso ocorrer, vai haver conflitos. Precisamos derrotá-los, para ele aprender como ouvir os trabalhadores", ameaçou. Segundo o sindicalista, caso José Serra seja eleito, ele acabaria com a política de reajuste do salário mínimo acima da inflação, definida a partir de 2006, entre outras medidas adotadas pelo governo Lula.

Augusto Chagas, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) comemorou o fato de o Brasil ter deixado para trás o "momento de marasmo" econômico e social, quando "milhares passavam fome e viviam sem emprego". Atualmente, o cenário é de democracia fortalecida, segundo ele. "Isso acontece pelo protagonismo político dos movimentos sociais e de trabalhadores que criaram as condições para os avanços", celebrou.

"A elite brasileira está furiosa e vai mobilizar todas as suas armas", disse Chagas. Ele classificou o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, de "mentiroso" por estabelecer, ao comandar as reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), uma "criminosa" taxa de juros "que impede dias de mais desenvolvimento".

"Nosso projeto popular com soberania para os povos é contra o modelo machista e homofóbico que valoriza o latifúndio e o agronegócio, que estimula o consumo desenfreado e não valoriza o trabalho das mulheres", enumerou Sônia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres.

A CMS é formada por 28 movimentos e entidades sociais, incluindo três centrais sindicais, entidades de representação de negros, mulheres, ativistas pelo direito à moradia, entre outros.


* Por: Anselmo Massad, Rede Brasil Atual

domingo, 30 de maio de 2010

Movimentos sociais precisam criar um novo partido contra o Estado

 Em entrevista, o jornalista José Arbex Jr. incita os movimentos sociais brasileiros a criar um instrumento político que se organize contra o Estado, galvanizando os excluídos do sistema capitalista e com um programa construído nas bases


Em meio à crescente exclusão promovida pelo avanço do capitalismo liberal nas últimas décadas, o jornalista José Arbex Jr. defende que os movimentos sociais formem um novo partido no Brasil. Para ele, essas organizações são as únicas da esquerda que conseguem dialogar com os setores alijados da economia capitalista, como os sem terra e sem teto. Esses grupos tendem ser mais e mais massacrados, uma vez que o neoliberalismo é incapaz de incorporá-los – pelo contrário – na sua dinâmica. Assim, o Estado assume um caráter cada vez mais repressor e segregacionista para poder manter uma certa estabilidade social. O que Arbex propõe, então, é que os movimentos sociais impulsionem um instrumento político que, aglutinando os excluídos, parta do pressuposto de que o Estado brasileiro foi construído contra a nação, e coloque a questão do poder, dando um salto qualitativo em relação à sua condição atual.


Brasil de Fato – No Brasil, negros, pobres e as comunidades carentes, principalmente dos grandes centros  urbanos, têm sido vítimas de todas as formas de violência, principalmente da violência policial, do Estado. Como você avalia esse caos social que o Brasil vive hoje?

José Arbex Jr. – Se você comparar a situação de hoje com a de outubro de 1992, quando ocorreu o massacre do Carandiru [em São Paulo-SP], você vai ver uma diferença muito grande. Naquela ocasião, foram mortos 111 presos e isso provocou uma grande polêmica nacional, um escândalo que a sociedade tratou como um acontecimento inaceitável. Em comparação, hoje, o governador do Rio de Janeiro [Sérgio Cabral – PMDB] exibe  triunfalmente a estatística de que a polícia está matando mais de 1.500 pessoas por ano nos morros cariocas – um Carandiru por mês. E isso não provoca nenhuma indignação na sociedade, é como se fosse normal. A polícia, tanto no Rio como em São Paulo, vem usando um expediente que é inconstitucional, que é o mandado de busca coletivo. Ou seja, ela tem o direito de entrar na sua casa não porque você seja suspeito de ter cometido um crime, não porque você seja suspeito de ter ligação com o crime organizado ou algo do tipo, mas simplesmente porque você mora naquele lugar. Seria possível um mandado de busca coletivo no Jardins? Eu não digo nem no bairro, digo em um quarteirão do Jardins, aliás, nem em um quarteirão, um mandado coletivo em um prédio da rua Oscar Freire? Acha que isso seria possível, todos os moradores serem passíveis de ter a polícia dentro de seus apartamentos somente porque moram ali? É óbvio que não. Então temos um Estado que trata alguns brasileiros como portadores de direitos e outros como portadores de direito nenhum. Estamos num processo de terror que atinge especificamente um setor mais numeroso da população, que são os trabalhadores.


A ONU tem divulgado dados que apontam o Brasil com uma das maiores taxas de homicídios do mundo...

A ONU considera que o Brasil tem uma das maiores taxas de homicídios do mundo, com algo em torno de 50 mil mortes por ano, e que a polícia e esquadrões da morte são os maiores responsáveis por essa façanha. Morre muito mais gente baleada no Brasil do que no Iraque, na Palestina e em outras áreas conflituosas do planeta. Só para efeito de comparação: os 30 anos de guerra civil entre protestantes e católicos na Irlanda, iniciada em 1968 e considerada de extrema violência, produziram menos de 3 mil mortes, isto é o equivalente a três semanas normais no Brasil. Isso é uma situação permanente, que a mídia acoberta e que está se tornando algo natural. É muito perigoso. Nós sabemos no que dá quando você naturaliza a matança, a segregação do Estado, o terror sobre populações indefesas... Basta olhar a história recente da Alemanha. Isso é muito preocupante e é o traço mais terrível da conjuntura nacional hoje.

E quem são os principais responsáveis por essa situação?

Em primeiro lugar é o Estado. É o Estado que abriu mão de universalizar as leis. As leis são válidas para todos os cidadãos, independentemente de sua religião, cor, raça, de sua conta bancária. Elas são universais e é para isso que o Estado serve – mesmo o burguês –, para tornar as leis universais e não para beneficiar determinados grupos da sociedade. Em segundo lugar, a responsabilidade é de um governo – tanto federal como local – que privilegia o pagamento anual de R$ 200 bilhões de juros para os bancos ao invés de criar uma infraestrutura básica – de educação, saúde, transportes e saneamento básico... – que tornaria decente a vida das pessoas, assegurando-lhes aquilo que a burguesia garantiu, por exemplo, na França, nos Estados Unidos, na Inglaterra. Não estou falando de socialismo, mas de direitos burgueses. Hoje, você tem um governo que destrói cada vez mais o Estado em nome do superávit primário e faz com que a vida de milhões de pessoas que habitam nas periferias seja um inferno total. Os grandes grupos interessados na especulação imobiliária, as empreiteiras e os agentes do capital financeiro e os grupos que controlam o Estado no Brasil fazem configurar esse tipo de política social. Os responsáveis estão muito bem estabelecidos. Com isso, não estou desculpando a bandidagem, não estou dizendo que a periferia tem muito bandido porque não tem a presença do Estado e que a bandidagem se justifica pela ausência do Estado. O que estou dizendo é que evidentemente é muito mais propício o desenvolvimento do crime organizado e da bandidagem numa situação de degradação moral de uma população do que numa situação na qual as pessoas tenham vida digna. As pessoas, numa situação desesperada, veem como saída o narcotráfico, a organização em gangues, porque elas não encontram outra saída; é óbvio. O terror do Estado alimenta o crime e o crime alimenta o terror de Estado.

E a principal vítima desse sistema é a juventude.

Principalmente. Se você pegar os índices de homicídios que o próprio Estado brasileiro divulga, você vai ver que a imensa maioria é de homens entre 16 e 28 anos. Negros, pobres, claro a imensa maioria pobres, morando nestes setores considerados malditos, a chamada periferia. Eu nem gosto de usar o nome periferia porque periferia acabou adquirindo uma conotação pejorativa como se houvesse uma homogeneidade no modo de vida e interesses culturais etc., em todo o Brasil. Quando você fala em periferia, parece que a periferia em São Paulo é igual a do Rio, que é igual a do Recife, de Salvador, de Belém... E não é verdade, cada um desses lugares tem os seus dilemas sociais, culturais, morais, econômicos. São distintos. Mesmo aqui em São Paulo você não pode comparar Jardim Ângela, por exemplo, com Heliópolis. Quer dizer, a periferia é um todo, cinzento, inventado pela mídia para designar uma mancha, que ameaça a estabilidade social, a vida dos cidadãos decentes, que somos nós da classe média, os que vivem no centro urbano, como se houvesse um cordão de ameaça àqueles que são os “bons cristãos”. Mesmo esse termo periferia já é um rótulo que acoberta o assassinato da juventude. Logo, se o cara é assassinado pela polícia, aí você fala: “mas ele é da periferia”... pronto, já está justificado.
Aliás nós temos um movimento muito importante hoje no Brasil que são as Mães de Maio, que são as mães daquelas 600 pessoas (mais ou menos) assassinadas em maio de 2006, que a polícia matou como represália aos ataques do PCC. Entre os assassinados tinham uns jovens entregadores de pizza cujo único crime foi – eles estavam ouvindo música naqueles walkman – não ouvir a sirene da polícia e não parar a moto. Os jovens são assassinados sob o rótulo da periferia, que tornam todos suspeitos. É como na Alemanha nazista, você falava “é judeu”, pronto, estava justificado.

O governo do Rio de Janeiro está construindo muros para isolar os pobres. Como você vê isso?


É o muro da segregação. Os muros agora estão se multiplicando pelo mundo inteiro e são uma decorrência do próprio sistema capitalista, que já não encontra saída para integrar bilhões de seres humanos na economia. Eles não têm como integrá-los. A única forma que encontram para preservar a ordem é criar muros. Mas então você vai me dizer: mas não é um exagero falar em bilhões? Não. Basta analisar as estatísticas recentes da FAO, que é o órgão da ONU para a agricultura, que você vai ver que, pela primeira vez na história da humanidade, o sistema econômico conseguiu produzir a fantástica cifra de 1 bilhão de famintos. Se associar esse 1 bilhão de famintos àqueles chamados subnutridos – que são os que não são famintos porque conseguem o mínimo de calorias necessárias para se manter vivos nas próximas 24 horas –, já são 2 bilhões. E se associar isso à rede extra-econômica para conseguir comida – os subnutridos que roubam para conseguir 1 litro de leite para dar ao fi lho –, teremos metade da humanidade. Bilhões de seres humanos que não são e não serão integrados à economia. A única saída para o sistema é considerá-los descartáveis. E, para isolar os descartáveis, cria muros.

Esse cenário coloca para a esquerda, que tem se mostrado incapaz de organizar essa imensa maioria da população, um desafio muito grande. Como você vê a esquerda brasileira diante desse quadro?


Tenho uma visão muito particular sobre isso. Considero que o MST encontrou historicamente uma maneira de integrar os setores mais excluídos e miseráveis da sociedade brasileira num movimento organizado, que confere aos seus participantes dignidade, consciência política e a oportunidade de assumir os seus próprios destinos como cidadãos. Isso faz do MST o movimento mais importante da história do Brasil, com certeza da história republicana. O MST e boa parte desses movimentos espelhados na sua experiência, como o MTST [sem teto], o MAB [atingidos por barragens] e tantos outros, encontraram uma fórmula de organizar suas bases e, se fizermos uma radiografia daquilo que acontece hoje nos morros urbanos, no campo, em todos os setores que sofrem discriminação, nós vamos descobrir que existe uma boa base de organização. Não acho que existe uma dispersão total.

Agora, o problema é que esses movimentos sociais no seu conjunto precisam dar um salto de qualidade e criar um movimento que aponte concretamente a questão do poder. O momento que vivemos no Brasil provou o esgotamento da fórmula do partido eleitoral do tipo PT para resolver os problemas dos grandes setores de massa no Brasil. O PT não resolveu esse problema, ele chegou ao poder e não fez reforma agrária; conduziu a macroeconomia ao agrado do capital financeiro mundial; e, hoje, uma revista como a Veja e jornais como O Estado de São Paulo afirmam claramente que tanto faz Dilma Rousseff ou José Serra porque os dois vão aplicar a mesma macro-política. Pode ter diferença cosmética, no sentido de que talvez a Dilma seja menos repressiva e prossiga com alguns programas que dão migalhas sociais. Mas isso não resolve os problemas anteriormente apontados. Portanto, acho que os movimentos sociais precisam dar um salto de qualidade e criar uma organização que aponte uma alternativa estratégica, que coloque a questão do poder. É necessário um instrumento político que reúna esses movimentos sociais e aponte uma alternativa de poder. Está na hora de um novo partido no Brasil. Ou de uma frente plural de partidos – partidos ou movimentos sociais. Teria de se pensar uma forma criativa de realizar essa organização, mas que dê um salto qualitativo. Nesses anos todos, os movimentos criaram e construíram direções que são conhecidas nacionalmente e internacionalmente, identificadas com transformações da sociedade, que não se deixaram cooptar por esse processo de participação lucrativa na economia neoliberal, que não aceitaram participar do esquema, direções identificadas com as lutas cotidianas dos trabalhadores brasileiros na cidade e no campo. Essas direções existem, são reconhecidas e elas têm a responsabilidade, na minha opinião, de assumir esse novo momento da história brasileira.

Você está defendendo a criação de um novo instrumento político. Isso significa que os atuais partidos e organizações da esquerda não têm conseguido dar respostas às necessidades da imensa maioria da população e não conseguem enfrentar essa nova realidade brasileira como um instrumento de transformação?


Sem dúvida nenhuma. Historicamente, os partidos brasileiros – incluindo o PT, do qual eu também fazia parte, portanto não estou me excluindo dessa história – foram capazes de atingir uma massa de trabalhadores com carteira assinada, funcionários públicos, operários da grandes metalurgias, da indústria de automóveis etc. e até uma faixa de pequenos comerciantes, uma classe média pauperizada. Até aí esses partidos chegaram. Mas isso constitui uma minoria da população. A grande maioria está hoje na periferia, no campo, no Brasil profundo. E esses setores nunca foram organizados pelos partidos. Eles foram muito mais organizados pela Rede Globo, que chega em qualquer lugar, no ponto extremo da Amazônia, os caras têm uma antena parabólica e vão assistir a novela Viver a Vida. Logo, quem atingiu esses setores? O MST, o MAB, o MTST atingiram. Hoje, temos uma situação na qual os partidos que dizem representar a população não dialogam com esses setores. Ou melhor, dialogam na forma da porrada, do terrorismo de Estado. E, por outro lado, os movimentos sociais que organizam esses setores estão excluídos da esfera do poder. Isso configura uma situação absolutamente intolerável, porque significa que o Estado brasileiro existe para um determinado setor da sociedade e para outro não. Então, os partidos historicamente fracassaram nessa missão e os movimentos sociais foram bem sucedidos em organizar esses setores. Quando eu digo bem sucedidos não significa que o serviço já está feito. Ainda há muita coisa para fazer. E o MST mostrou que o caminho existe. Ou seja, é possível organizar esses setores. Assim, ou os movimentos sociais assumem essa tarefa de dar um salto político e conduzir esses setores que nunca fi zeram parte da vida política brasileira para uma outra saída estratégica na qual eles passem a fazer parte – e devem fazer isso já, urgente – ou o que nós vamos ver é cada vez mais esses setores pagando o preço terrível de não terem uma voz política e serem segregados por muros.

E a ofensiva permanente das elites para criminalizar os movimentos sociais e as lutas, você acha que um instrumento político, tal qual você coloca, ajudaria as organizações nessa batalha? Você acha que um partido político legalizado seria um suporte fundamental frente a esse cenário?

Isso me parece óbvio porque quando a direita faz sua ofensiva ela usa o aparelho de Estado. Por exemplo, montam uma CPI para paralisar o MST, que é obrigado a drenar toda a sua energia para se defender. Assim, o aparelho de Estado monta a ofensiva, conta com o braço armado que é a polícia e o exército, e vem para cima dos movimentos sociais. E cria um consenso social na classe média por meio da mídia. O aparelho de Estado não é neutro, como disse antes ele não universaliza as leis, e é lógico que, se os movimentos sociais não tiverem um instrumento político que coloque concretamente a questão do Estado, essa situação vai se eternizar e conduzirá os movimentos sociais a um desastre absoluto, porque hoje estão numa situação de impotência. Por exemplo, no caso de Belo Monte. Populações inteiras serão expulsas de suas localidades por causa de uma usina, um empreendimento que interessa a meia dúzia de empreiteiras, e estão sem defesa. Eles estão dispostos ao auto-sacrifício para preservar aquelas terras, dizem que irão para as áreas que serão inundadas. Esse pessoal está sem a defesa de um instrumento político, porque não tem um partido que os defenda de uma forma decisiva, que  mobilize a população, que seja capaz de articular todos os movimentos sociais em sua defesa. Isso não existe. O PT não é esse partido. Então, se não houver esse salto qualitativo, é óbvio que o neoliberalismo, tendo como instrumento o Estado, vai produzir uma matança, uma criminalização cada vez maior dos movimentos sociais. Aliás, as últimas declarações, tanto do Serra quanto da Dilma, apontam para esse caminho. O tucano multiplica diariamente acusações contra o MST. E a petista, quando visitou os vários agrishow Brasil afora, disse claramente que não apoia invasão de terra, e usou o termo invasão, que é significativo, porque ela sabe que não se trata de ocupação.

Quais elementos políticos centrais devem nortear um novo instrumento dessa natureza, inclusive para não se incorrer em equívocos de tantos outros partidos brasileiros?

Hoje, qualquer articulação política séria no país tem que partir de um pressuposto, tem que ter uma discussão muito séria de que no Brasil a nação se organizou contra o Estado. Isto é uma formulação do professor Istvan Iancson – que faz parte da antiga geração de professores universitários que eram de fato professores universitários. Ele mostra que, no Brasil, durante 400 anos de escravidão houve uma política de Estado destinada a reprimir a imensa maioria da população, composta de povos originários e de escravos trazidos da África. Paralelamente, nunca houve no Brasil nenhum setor da burguesia disposto a produzir um movimento revolucionário semelhante ao que houve na França e outros países, que tinham como objetivos integrar a população trabalhadora ao processo produtivo.  Mesmo na história republicana, nos 30 primeiros anos da oligarquia do café com leite; no Estado Novo de Getúlio Vargas, que embora tivesse um projeto nacional, comandou esse projeto na base da outorga de uma estrutura sindical atrelada ao Estado, na qual os trabalhadores jamais foram independentes para construir a sua autonomia do Estado; e na ditadura militar que durou vinte e tantos anos. Quer dizer, temos uma longa história de sucessivas catástrofes que demonstram que, no Brasil, o Estado sempre foi considerado pelas elites como um órgão privado delas. O surgimento do PT e da CUT produziu uma espécie de abalo nessa história, porque, pela primeira vez, você teve a formação de uma central independente, que foi a CUT, e a formação de um partido político que não era um impulsionado a partir das elites e que conseguiu produzir abalos na estrutura do Estado que os partidos tradicionais de trabalhadores como o PC e outros nunca conseguiram produzir. Assim, é inegável que o surgimento do PT e da CUT produziram esse abalo, algo extremamente importante na história do brasileira. Porém, acho que tanto o PT quanto a CUT não levaram até o fi m essa dimensão de que o Estado foi construído contra a nação. E que, simplesmente, participar da atual estrutura do Estado não resolve o problema, porque é um Estado construído contra a nação brasileira.

As estruturas do Estado permanecem inalteradas.


É, continuam inalteradas. Por exemplo, para tornar bem visível o que estou falando, acho equivocado dizer que no Brasil não funciona o sistema de saúde. Ou não funciona o sistema de educação pública. Funciona perfeitamente. Ou alguém acha que em algum momento desse país as elites, que mandam no Estado, pretenderam construir um sistema realmente eficaz e que garantisse saúde e educação de qualidade para a maioria do povo brasileiro? Alguém acha isso? Só se for louco! Então, eu acho que esses sistemas funcionam perfeitamente bem à luz do que é o Estado brasileiro, à luz dos jagunços que mandam nesse país há 500 anos. Assim, se você construir um partido que não coloque na ordem do dia essa questão de que é preciso haver uma revolução que transforme o Estado brasileiro e que crie as condições para que haja uma integração entre Estado e nação, ele vai fracassar como todos os outros partidos. Eu acho que o único partido que teria condições de fazer isso é um partido que nasça das bases – e aí bases eu quero dizer os setores mais excluídos, mais pobres, mais miseráveis da população brasileira, que são os movimentos sociais, os camponeses, os trabalhadores desempregados, os sem teto, os que têm que se virar todo dia para conseguir comida para as próximas 24 horas, os povos originários. Todos eles constituem essa camada social que jamais foi integrada pelo Estado brasileiro e que sabem exatamente o que significa o Estado brasileiro. Então, na minha opinião, embora a experiência do PT e da CUT tenha sido extremamente positiva porque produziu abalos nessa relação do Estado e nação, eles não foram até o fi m. O PT nunca se constituiu de fato como um partido anticapitalista. Nunca se colocou com a tarefa de destruir o capitalismo.

O objetivo desse novo partido contra o Estado brasileiro vai ser o quê? Vai ser um partido socialista, social desenvolvimentista, vai querer desenvolver o capital interno?

Não sei. Não sou a Mãe Diná. Acho que não cabe a uma direção iluminada dizer o que esse partido vai ser. Nesse momento, o que se coloca em primeiro lugar é uma formulação que consiga agregar esse conjunto de movimentos sociais. Isso estabelece uma primeira base de discussão, ou seja, como é que vamos agregar esses movimentos sociais e, a partir das discussões feitas por esses movimentos sociais, dos núcleos de base. Uma discussão programática vai surgir da base. E que tenha necessariamente o seguinte: nós não queremos um partido que se integre ao Estado brasileiro tal como ele existe hoje. Esse é o ponto. O resto a gente discute. Não podemos colocar uma série de pré-condições que funcionariam como obstáculos à formação de um grande partido de base, realmente popular.

Você, como intelectual, imagino que estaria neste partido. Você acredita que outros intelectuais, a universidade, estariam também num partido com esses objetivos? Temos reserva moral na esquerda brasileira que seja capaz de impulsionar um partido dessa natureza?

Claro que temos reserva moral... e prefiro não citar nomes para não cometer injustiças... Mas, se realmente o MST é um movimento de importância histórica no Brasil, logo, é claro que, desse ponto de vista, os dirigentes e porta-vozes do MST estão entre aqueles que podem e devem impulsionar o processo. Acho que o João Pedro Stedile tem um papel particular nisso, por sua visibilidade nacional e internacional. Mas há muita gente boa nos movimentos sociais, nos partidos de esquerda e mesmo dentro do PT que se empolgaria por uma proposta de construção de um poderoso partido anticapitalista no Brasil.

Agora, ao mesmo tempo, acho que esse partido provocaria um susto em um vasto setor da classe média brasileira. Imagina o que vai acontecer no momento em que um partido conseguir juntar o MST, os movimentos que se organizam na periferia, hip hop, as Mães de Maio etc. e começa a dar visibilidade para o Brasil de cara feia. Ou seja, não é o Brasil que vai fazer compra em shopping center. Mesmo dentro da universidade, pessoas que hoje se dizem a favor de uma transformação social fi cariam assustadas quando elas vissem a cara da transformação social. Mas, ao mesmo tempo, isso geraria um efeito fantástico de produzir um senso de auto-estima e de dignidade em dezenas de milhões de brasileiros que hoje estão em baixa porque acham que não têm futuro. Você imagina o que significa para um trabalhador que trabalha 15 horas por dia para ganhar um salário-mínimo e que se afoga na cachaça, de repente, perceber que pode participar de algo desse porte? Isso daria um impulso tremendo à organização política brasileira. Seria algo muito superior ao que está acontecendo hoje na Venezuela com o Hugo Chávez. Superior dado o porte da economia brasileira, o número de habitantes e o poder que teriam esses milhões de trabalhadores organizados, que tem uma tradição de luta negada pela elites, o que é um completo absurdo. Se você pensar desde os Quilombos dos Palmares até o MST, passando pelas Ligas Camponesas, por Canudos, pela Revolta dos Malês e pelo século 19 inteiro de revoltas regionais, esse povo não parou de lutar uma década. Portanto, nós temos uma experiência de combate, uma história de luta. E um partido desse porte teria um poder enorme de galvanizar a nação brasileira. Desde que esse partido não caia no conto de se integrar ao Estado brasileiro tal como ele existe hoje. É um partido que tem que ter o compromisso de ruptura. Sem esse compromisso não conseguiria galvanizar ninguém. E acho que, nesse processo, toda a gente acabaria formulando aquilo que todo mundo diz e anseia, que é um programa para o Brasil feito com base na realidade brasileira e não nas formulações europeias. Não que eu esteja aqui negando Karl Marx ou outro pensador europeu, seria uma estupidez. O que estou dizendo é que justamente a ausência do povão na política é produzir um tipo de pensamento que é muito intelectualizado, muito antenado com concepções de vanguarda que existem na Europa e que foram formuladas na Europa, mas que se ressentem do diálogo com o povão mesmo, que tem sua própria história e que não é a história europeia. É uma outra história. Acho que isso produziria uma transformação na própria universidade. Quer dizer, os intelectuais teriam que responder ao desafio para eles mesmos como intelectuais com um partido desse tipo.




Quem é

José Arbex Jr. é editor especial da revista Caros Amigos, é doutor em história social pela Universidade de São Paulo (USP), professor de jornalismo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), autor de Showrnalismo – A Notícia Como Espetáculo e O Jornalismo Canalha (editora Casa Amarela). Durante os anos de 1980 e 1990, trabalhou no jornal Folha de S. Paulo e, em 2003, foi editor-chefe do Brasil de Fato.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

A religião mercado

Quase todos os dirigentes políticos, sejam da esquerda tradicional ou da direita, sejam do Norte ou do Sul, confessam uma verdadeira devoção pelo mercado e, em particular, pelos mercados financeiros. Na verdade, deveríamos dizer que eles criaram uma verdadeira religião do mercado. A cada dia, em todas as casas do mundo que têm televisão ou internet, celebra-se uma missa dedicada ao deus mercado durante a divulgação da evolução das cotações da Bolsa e dos mercados financeiros. O deus Mercado envia seus sinais através do comentarista financeiro da televisão ou da imprensa escrita. Isso não acontece não somente nos países mais industrializados, mas também na maior parte do planeta. Em Shangai ou em Dakar, no Rio de Janeiro ou em Tombuctu, qualquer um pode saber quais são os “sinais enviados pelos mercados”.
Em todas as partes, os governos promoveram privatizações e criaram a ilusão de que a população poderia participar diretamente dos ritos do mercado (mediante da compra de ações) e que, como contrapartida, se beneficiaria se soubesse interpretar corretamente os sinais enviados pelo deus Mercado. Na verdade, a pequena proporção da população trabalhadora que adquiriu ações não tem o mínimo peso nas tendências de mercado.
Daqui a alguns séculos, talvez alguém leia nos livros de História que, a partir dos anos 80 do século XX, um certo culto fetichista provocou furor. A expansão assim como o poder que esse culto atingiu poderão ser relacionados com os nomes de dois chefes de Estado: Margaret Thatcher e Ronald Reagan. Os livros poderão destacar ainda que esse culto se beneficiou, desde o início, da ajuda dos poderes públicos e das potências financeiras privadas. Na verdade, para que esse culto encontrasse certo eco junto às populações, foi necessário que os meios de  comunicação públicos ou privados rendessem-lhe homenagens cotidianamente.
Os deuses desta religião são os Mercados Financeiros, aos quais se destinaram templos chamados Bolsa, para onde só são convidados os grandes sacerdotes e seus acólitos. O povo dos crentes, por sua vez, é convidado a entrar em comunhão com os deuses Mercados mediante a tela da TV ou do computador: o jornal, o rádio ou o guichê do banco.
Até nos rincões mais recônditos do planeta, graças ao rádio ou à televisão, centenas de milhões de seres humanos, a quem se nega o direito de ter suas necessidades básicas satisfeitas, são convidados a celebrar os deuses Mercados. Aqui no Norte, na maioria dos jornais lidos pelos assalariados, pelas donas de casa e pelos desempregados, existe uma seção do tipo “onde colocar seu dinheiro”, apesar da esmagadora maioria de seus leitores e leitoras não ter nenhuma ação na Bolsa. Paga-se aos jornalistas que ajudem aos crentes a compreender os sinais enviados pelos deuses. Para aumentar o poder destes deuses sobre o espírito dos crentes, os comentaristas anunciam periodicamente que eles enviaram sinais aos governos para indicar sua satisfação ou descontentamento.
O governo e o Parlamento gregos, tendo compreendido finalmente a mensagem recebida, adotaram um plano de austeridade de choque que fará com que os debaixo paguem o custo da crise. Mas os deuses seguem descontentes com o comportamento de Espanha, Portugal, Irlanda e Itália. Seus governos também deveriam levar como oferendas importantes medidas anti-sociais para acalmá-los.
Os lugares onde os deuses angustiam-se com a manifestação de seus humores estão em Nova York, em Wall Street, na City de Londres, nas Bolsas de Paris, Frankfurt e de Tóquo. Para medir sua satisfação, inventaram-se instrumentos que levam o nome de Dow Jones em Nova York, Nikei em Tóquio, CAC40 na França, Footsie em Londres, Dax em Frankfurt ou IBEX na Espanha. Para assegurar a benevolência dos deuses, os governos sacrificam os sistemas de seguridade social no altar da Bolsa e, além disso, privatizam.
Valeria a pena perguntar-se porque foi outorgada essa dimensão religiosa a estes operadores. Eles não são nem desconhecidos nem meros espíritos. Possuem nome e domicilio: são os principais dirigentes das 200 maiores multinacionais que dominam a economia mundial com a ajuda do G7 e de instituições como o FMI – que voltou ao centro do cenário graças à crise após ter passado um tempo no purgatório.
Também atuam o   Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio, ainda que esta não esteja em seu melhor momento.  Ninguém sabe se ela poderá ser, de novo, a escolhida dos deuses. Os governos não são uma exceção: desde a era de Reagan e Thatcher abandonaram os meios de controle que contavam para monitorar os mercados financeiros. Dominados pelos investidores institucionais (grandes bancos, fundos de pensões, companhias de seguros, hedge funds...) os governos doaram ou emprestaram aos mercados trilhões de dólares para que pudessem cavalgar de novo, depois do desastre de 2007-2008. O Banco Central Europeu, o Federal Reserve dos EUA e o Banco da Inglaterra emprestaram diariamente, com uma taxa de juro inferior à inflação, enormes capitais que os investidores institucionais se apressaram em utilizar de forma especulativa contra o euro, contra os tesouros dos Estados, etc.
Atualmente, o dinheiro pode atravessar fronteiras sem nenhuma imposição fiscal. A cada dia cerca de 3 trilhões de dólares circulam pelo mundo saltando as fronteiras. Menos de 2% desta soma é utilizada diretamente no comércio mundial ou em investimentos produtivos. Mais de 98% estão envolvidos em operações especulativas, em especial relacionadas às moedas, aos títulos da dívida ou às matérias primas. Devemos acabar com a trivialização desta lógica de morte. É preciso criar uma nova disciplina financeira, expropriar esse setor e colocá-lo sob controle social, gravando com fortes impostos aos investidores institucionais que primeiro provocaram a crise e depois se aproveitaram dela, auditando e anulando as dívidas públicas ilegítimas, instaurando uma reforma tributária redistributiva, reduzindo radicalmente a jornada de trabalho a fim de poder se contratar massivamente, sem diminuição de salários. Em duas palavras, começar a colocar em marcha um programa anticapitalista.

Eric Toussaint é presidente da divisão belga do Comitê pela Anulação da Dívida do Terceiro Mundo (CADTM), doutor em Ciências Políticas na Universidade de Liége (Bélgica) e na Universidade de Paris VIII (França).

Satisfeito com depoimentos, relator da CPI do MST abre mão de fazer perguntas

"Não tenho nenhuma pergunta a fazer, só quero parabenizar os três ministérios pelo excelente trabalho que estão desenvolvendo". A frase é do deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP), relator da comissão parlamentar mista de inquérito criada para investigar supostas irregularidades em convênios firmados entre a União e entidades ligadas à reforma agrária. Representantes dos Ministérios da Cultura, do Trabalho e Emprego e do Meio Ambiente negaram qualquer irregularidade nos convênios que motivaram a reunião da CPMI do MST realizada na tarde desta quarta-feira (26).
O diretor de Florestas da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João de Deus Medeiros, foi o primeiro a falar. Ele deu explicações sobre a denúncia de que a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (Conecrab) seria uma organização de fachada do MST criada para burlar a lei e receber repasses do governo federal. O funcionário disse que o ministério celebrou o Convênio 0008/2005 com a entidade, e está analisando o relatório final encaminhado com atraso.
Segundo João de Deus Medeiros, o convênio investigado tinha o objetivo de elaborar um diagnóstico da cobertura florestal em áreas destinadas à reforma agrária. A primeira das cinco metas (realização de cinco seminários nos diferentes biomas) foi cumprida parcialmente, já que faltou um dos seminários. Houve um atraso na prestação de contas da segunda etapa (coleta de informações junto aos órgãos governamentais), o que motivou o cancelamento da liberação da terceira parcela. Porém, informou o diretor, a coleta foi realizada.
A terceira etapa previa a realização de cinco cursos para formação de técnicos florestais e de equipes de assistência técnica. De acordo com João de Deus, ela teria sido cumprida integralmente. A quarta etapa era a realização de cinco encontros regionais. Somente dois foram realizados. A entrega do relatório final era a última etapa do convênio. Como ela foi feita com atraso, o ministério determinou uma tomada de contas especial. João de Deus informou que o documento está sendo analisado. Se ficar comprovado que a prestação de contas atende ao que determina o convênio, será feita uma recomendação para retirar o processo da tomada de contas especial.
Trabalho
O assessor especial do Ministério do Trabalho Manoel Eugênio Guimarães de Oliveira, segundo a se pronunciar na reunião da CPMI, garantiu que até o momento não foi detectada qualquer irregularidade que pudesse confirmar a suspeita de fraude no convênio que o ministério firmou com o Centro de Formação e Pesquisa Contestado (Cepatec). Ele declarou que o centro foi inscrito como inadimplente no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) em virtude de não ter prestado esclarecimentos sobre o grande número de CPFs inválidos entre os participantes do curso.
- A prestação de contas está em avançado estágio. Estamos realizando a checagem dos CPFs apontados como inválidos. Se ao final da apuração for constatado que não há correspondência entre a pessoa física que participou do curso e o número do documento, vamos solicitar a devida devolução e aguardar o recolhimento do recurso - afirmou Manoel Guimarães.
O deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) pediu a Manoel Guimarães que respondesse a alegação feita em reunião anterior pelo deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS), vice-presidente da CPMI, de que dos 1.300 inscritos no curso do Cepatec 335 tinham CPFs inválidos. O assessor do Ministério do Trabalho comunicou que o número de CPFs ainda não confirmados caiu para 115, após checagem. Paulo Teixeira opinou que a baixa escolaridade dos beneficiados pode ter contribuído para o inscrito ter anotado errado o seu número de CPF.
A chefe de gabinete da Secretaria do Audiovisual, Ana Paula Dourado Santana, e a coordenadora de gestão de pontos de cultura da Diretoria de Acesso à Cultura da Secretaria de Cidadania Cultural, Lucia Helena Fernandes Campolina, ambas do Ministério da Cultura, falaram sobre convênios com o Instituto Técnico de Estudos Agrários e Cooperativismo (Itac).
As representantes do Ministério da Cultura descartaram a existência de irregularidades e comunicaram que o objeto dos convênios foi cumprido e eles agora estão na fase final da prestação de contas. Nenhum parlamentar da oposição participou da reunião da CPMI das ONGs, que foi presidida pelo deputado federal Doutor Rosinha (PT-PR)
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*Roberto Homem / Agência Senado

quinta-feira, 27 de maio de 2010

MANIFESTO AGROECOLÓGICO DE SÃO MIGUEL DO OESTE

 Os mais de 2000, agricultores e agricultoras, estudantes, professores, agentes públicos, pesquisadores técnicos, extensionistas, movimentos sociais e organizações afins, moradores do campo e da cidade, oriundos de diversas regiões de Santa Catarina, de outros estados e países vizinhos, reunidos no V Seminário Estadual de Agroecologia com o tema “Agroecologia: campo e cidade com vida saudável”, nos dias 20 e 21 de Maio de 2010, no município de São Miguel do Oeste/SC, nos dirigimos a toda a sociedade catarinense e brasileira, para manifestar o que segue:

1. Denunciamos e repudiamos com veemência as práticas e políticas que apóiam a produção agroquímica e transgênica, visto que estas comprovadamente contaminam e matam pessoas e as mais variadas formas de vida, eliminam a biodiversidade nativa e as sementes crioulas, contaminam a água, animais, plantas e alimentos. O modelo baseado na agroquímica, rouba dos agricultores a autonomia, a soberania alimentar dos povos, concentra terras e riquezas, provoca fome e êxodo rural, destrói e desvaloriza os conhecimentos e a cultura popular, causa desequilibro ambiental e provoca mudanças climáticas drásticas e muitas vezes irreversíveis. Os seus impactos ameaçam e comprometem o futuro da humanidade!

2. Anunciamos e apoiamos todas as iniciativas, as práticas, e políticas que objetivam promover a agroecologia enquanto paradigama, que conduzem ao desenvolvimento social e humano com respeito à vida,, á biodiversidade, à cultura, ao equilíbrio do meio ambiente, à saúde e a soberania alimentar dos povos, e a solidariedade entre as pessoas. A agroecologia aproxima e une a gente do campo e da cidade entorno de um objetivo comum: Promover vida saudável na plenitude das dimensões humanas. Pois entendemos que produzir e consumir alimentos agroecológicos é um ato de amor à vida.

Através dos painéis, oficinas temáticas, feira de saberes e sabores agroecológicos, depoimentos, trocas de experiências, sentimentos e conhecimentos, integração e compromissos assumidos mutuamente, reafirmamos uma vez mais a nossa crença de que construir um ambiente melhor para toda a coletividade humana é possível e necessário. Homens e mulheres conscientes são as bases deste novo mundo que queremos e vamos construir.

Imbuídos deste espírito de compromisso, responsabilidade e amor a vida propomos:

• Linhas de crédito com maior subsídio no período de transição agroecológica;

• Criação de centros de referência em agroecologia nas diversas regiões de Santa Catarina;

• Adotar a merenda agroecológica na rede estadual e municipais de ensino e outras instituições públicas, estimulando o chamado mercado institucional para produtos agroecológicos;

• Investimento contínuo do estado em pesquisa e extensão em agroecologia;

• Implementação de políticas de estímulo à comercialização direta de produtos agroecológicos como as feiras livres, em todos os municípios de Santa Catarina;

• Isenção de impostos para alimentos e produtos agroecológicos;

• Implementação de política pública de incentivo a eventos de formação, troca de experiências e articulação em agroecologia, com recursos previstos no orçamento e acesso desburocratizado;

• Aumento de impostos sobre alimentos que causam danos comprovados à saúde humana;

• Investimento público em iniciativas e projetos populares de conservação da biodiversidade, das sementes crioulas e dos biomas naturais nas diferentes regiões do estado.

• Limitar o financiamento público em insumos químicos para a agricultura familiar e camponesa;

• Incluir nos projetos político-pedagógficos e curriculuns escolares, princípios, disciplinas e conceitos da agroecologia.

• Tendo em vista a continuidade deste importante evento, para integrar o povo deste estado sugerimos que o próxima edição do Seminário Estadual de Agreocologia seja realizado no litoral catarinense, na região norte ou sul do estado de Santa Catarina.

São Miguel do Oeste, 21 de maio de 2010

Colaborador

*Adriano Scariot - Sindaspi

terça-feira, 25 de maio de 2010

UNE, CUT, MST e entidades definem posicionamento para as eleições

A Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS), que reúne 28 entidades, entre elas CUT, UNE e MST, realizará no próximo dia 31 de maio, segunda- feira, em São Paulo, uma Assembléia Nacional com objetivo de discutir, elaborar e aprovar a plataforma política do movimento social brasileiro para as eleições 2010. O documento será apresentado ao conjunto da sociedade e incluirá a pauta de reivindicações dessas entidades aos candidatos a presidente, governador, senador, deputado federal, estadual e distrital.

A Assembléia Nacional dos Movimentos Sociais acontecerá na quadra da sede do Sindicato dos Bancários (Rua São Bento, 413, Centro), a partir das 10h. São esperadas mais de 3 mil pessoas de todas as regiões do país, que representam movimentos de moradia, estudantis, trabalhadores, sem terra, sem teto, desempregados, além de intelectuais, comunicadores, pastorais e diversos sindicatos. A participação é aberta a qualquer cidadão, sem necessidade de credenciamento prévio.

POSICIONAMENTO PÓS GOVERNO LULA

Apesar de o governo Lula ter sido o que mais dialogou com os movimentos sociais brasileiros, a CMS aponta que as mobilizações e a pressão popular irão se acirrar em 2011, independentemente do resultado eleitoral. Além de aprovar o texto, a assembléia servirá para organizar as próximas mobilizações unificadas. A CMS incentivará também a constituição de comitês populares de campanha para as eleições 2010. Serão espaços pluripartidários de articulação dos movimentos sociais para intervenção no processo eleitoral.

PROJETO INICIADO EM JANEIRO

Sensibilizados com o momento histórico pelo que passa o Brasil neste início de século e atentos à responsabilidade de marcar sua posição no processo eleitoral de 2010, os movimentos sociais começaram sua articulação em janeiro, durante o Fórum Social Mundial - 10 anos, em Porto Alegre (dia 29) e o Fórum Social Temático de Salvador (dia 31). Nestes dois encontros, a CMS realizou a Assembléia dos Movimentos Sociais e lançou um duplo desafio:

1) Construir uma plataforma de lutas e propostas unificadas, apresentando um Projeto Popular para o Brasil;

2) Combinar uma intervenção qualificada no processo eleitoral, defendendo esse projeto, sem se deixar absorver pela lógica eleitoral, com a continuidade da mobilização social e a construção de uma agenda unificada de lutas.

Foram também realizadas plenárias em 15 estados, para absorver as reivindicações locais de cada região do país, mobilizando mais de 20 mil pessoas, unificando a rica diversidade de movimentos. Dessa forma, o amplo debate realizado em todo o território brasileiro renova a leitura de último documento lançado pela CMS, em 2006.

PRÉ-SAL, MEIO AMBIENTE, DESENVOLVIMENTO E SOLIDARIEDADE

O texto a ser aprovado se divide em cinco eixos temáticos, com o propósito de apontar as posições e intervenções da CMS sobre o atual momento político. Os cinco pontos são: "Soberania Nacional", "Desenvolvimento", "Democracia", "Mais Direitos ao Povo" e "Solidariedade". Para além desses temas, o documento deverá incluir novas bandeiras como a defesa do pré-sal 100% para o povo brasileiro, uma política de desenvolvimento social e ambientalmente sustentável, valorização do trabalho, universalização da internet banda larga e o fim das patentes de remédios.

O QUE É A COORDENAÇÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS - CMS

A diversidade marca a Coordenação dos Movimentos Socias (CMS), criada em abril de 2003 por organizações e entidades como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a União Nacional dos Estudantes (UNE). Espaço de convergência, reflexão e atuação conjunta, a CMS tem o objetivo de aglutinar propostas para o desenvolvimento do país e para a melhoria da vida do conjunto da sociedade. Trata-se de um espaço estratégico de convergência de todas as forças populares e democráticas. Juntas, elas constroem um campo de ação que coloca os movimentos sociais como protagonistas na produção de conhecimento e elaboração de alternativas viáveis e avançadas para o Brasil.

A CMS é formada por movimentos nacionais, mas nos estados participam movimentos e grupos locais. A Coordenação se organiza a partir de articulação horizontal e sem hierarquia por tipo ou forma de movimento. Não foram convidados partidos políticos, sendo que as diferentes correntes ideológicas se expressam por meio da sua presença nos movimentos de massa. Em todos os debates, se busca a pluralidade, o respeito à democracia e consenso nas decisões tomadas.

AS INFORMAÇÕES SÃO DA ASSESSORIA DE IMPRENSA

Sustentar 2010 inicia nesta quarta-feira, em Chapecó



O maior evento de energias renováveis do Estado de Santa Catarina inicia nesta quarta-feira (26), em Chapecó. Às 19h, no auditório do Lang Palace Hotel, a Assembleia Legislativa realiza a abertura oficial do Sustentar 2010 – III Fórum sobre Energias Renováveis e Consumo Responsável. Logo após haverá o lançamento do livro Inevitável Mundo Novo – a relação entre energias renováveis, produção de alimentos e o futuro do planeta (Volume 2).

Idealizado e coordenado pelo deputado estadual Pedro Uczai, o Sustentar é promovido pela Comissão de Economia, Ciência, Tecnologia, Minas e Energia do parlamento catarinense. Até a próxima sexta-feira, especialistas e profissionais de vários estados brasileiros, além de Portugal e da Alemanha, estarão reunidos em Chapecó para apresentar e discutir diferentes experiências em produção de energias renováveis. “Queremos fazer do Oeste o grande palco deste debate em 2010, para que a região que já é uma referência em produção de alimentos também possa avançar na produção de energias renováveis e se tornar uma referência nessa área”, explica Uczai.

No dia 27, no período da manhã, o Sustentar 2010 debaterá “Mudanças climáticas: interconexão entre o global e o regional”, com Francisco Aquino, do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Logo após, reunirá em um único painel os especialistas de Portugal, Vitor Silva, e da Alemanha, Karin Opphard, que falarão sobre diferentes experiências na área de energia solar e resíduos urbanos nestes países. À tarde, o público irá conhecer algumas experiências de produção de energias renováveis já existentes na região Oeste. Entre elas estão o parque eólico de Água Doce, uma Pequena Central Hidrelétrica (PCH) e uma fábrica de turbinas em Xanxerê, a hidrelétrica de Itá, uma bioconstrução em Seara e biodigestores em Chapecó.

Já no dia 27 serão realizados três painéis. Um deles debaterá a produção de energias renováveis e a geração distribuída, que entre os palestrantes terá o profissional da Itaipu Binacinal, Cleber Vanoli. Em seguida a discussão será sobre a política ambiental e energética em Santa Catarina, com a professora-doutora Noemia Bohn, e a doutora Claudia Santos, do Ministério do Meio Ambiente. Já pela parte da tarde serão abordados os desafios para se estabelecer novos padrões de consumo na atual sociedade, com o pesquisador-doutor da Embrapa, Paulo Armando de Oliveira, e o engenheiro agrônomo Leandro Borella.

A presença da ex-ministra de Minas e Energia e da Casa Civil da Presidência da República, Dilma Rousseff, também está pré-agendada para o último dia do evento. Ela cumprirá agenda na região sul do país e poderá participar do painel sobre o pré-sal e meio ambiente. As inscrições para o Sustentar 2010 são gratuitas e podem ser feitas pela Internet, no endereço http://www.alesc.sc.gov.br/, ou no local do evento antes da abertura oficial.

domingo, 23 de maio de 2010

Serra e a morte de Deus

José Serra precisa de ajuda. Não basta aquela que lhe é oferecida por uma mídia favorável. É necessário que alguém reavive seu senso de oportunidade. Um dos males que costumava atacar com muita frequência o brasileiro, principalmente aquele que vivia de salário (a maioria, portanto) consistia na tendência de ser enganado com facilidade. Faz cerca de oito anos que o PSDB deixou o governo e ainda não se deu conta de que a percepção da realidade mudou. Jogar palavras ao vento, com fez o pré-candidato tucano para uma platéia de militantes (?) do PPS, é um exercício arriscado, uma manifestação que mescla soberba e desespero em dosagem tão hilariante quanto assustadora. Mas nada disso nos permite duvidar de sua capacidade e argúcia analítica. Afinal, como diz o slogan de campanha dos tucanos: "O Brasil pode mais". Resta saber o quê. E para quem.

Ao afirmar, em uma tentativa de crítica à política econômica do governo Lula que "nós estamos voltando rapidamente a um modelo que não atende à demanda de emprego que o país possui", o ex-governador paulista aposta no total alheamento do eleitor brasileiro. Tamanha credulidade espanta, tendo em vista que o mundo do trabalho - a principal vítima do modelo neoliberal orquestrado pelo tucanato - aprendeu direitinho, na própria pele, o que significou o mercado desregulado como chave para o crescimento econômico e as virtudes do “Estado musculoso", elementos centrais no discurso serrista.

A afirmação sobre empregos não é piada, nem brincadeira de um notívago diletante, mas desespero de um candidato que, em face de uma conjuntura que lhe é totalmente adversa, tem que produzir discursos a todo e qualquer custo. E de Serra, pode-se afirmar várias coisas, menos a de não ser um ator político que sabe o que faz. Sua eventual perdição, entretanto, antes de ser festejada pelas forças progressistas, deve causar desconfiança e vigilância redobrada. Pois é inevitável que os ânimos se acirrem em seus dois principais pólos de apoio: a mídia corporativa e o Poder Judiciário.

Mas a comparação suscitada por suas declarações é inevitável. Segundo dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), o número de vagas criadas no mercado de trabalho bateu recorde no primeiro trimestre de 2010, com um saldo acumulado até março somando 657.259 empregos. Convém retornar no tempo e observar como se comportava a economia brasileira quando o pré-candidato tucano era ministro do Planejamento e Orçamento do primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso.

O desemprego na indústria atingia 5,7% em 1997 em relação a 1996, resultado fortemente influenciado pela taxa de dezembro, quando a queda foi de 2,6% em relação a novembro, a pior desde dezembro de 1990, segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para se ter uma idéia do tamanho da retração nos empregos, os dados do instituto mostravam uma queda anualizada de 7,3%. Quando Serra pôde mais, o trabalhador pôde menos.

Até então, o governo FHC registrava um desemprego industrial de 19,77%. Mas o “Brasil que não podia mais", aquele que os colunistas econômicos tanto enaltecem, vivia um amargo processo de ajuste, acentuado em 1996, com a atividade econômica represada e a queda no emprego apresentando taxas expressivas. Ao contrário do que afirma Serra, foi sob a batuta tucana que “o Brasil adotou uma política econômica desastrosa."

Mas o discurso do tucano foi além, mirando também o campo da ética, com críticas a supostas práticas de corrupção no governo petista. Como fazem as vestais tucanas, destampou um poço de demônios para sentenciar: "Se aquele que era o guardião da moral, da ética, do antipatrimonialismo toma outro rumo, o rumo oposto, para muita gente Deus morreu". Que metafísica, o ex-governador paulista quer superar com essa alusão a Nietzsche?

Decerto não deve ser a do governo ao qual serviu em dois ministérios. Fernando Henrique não teve escrúpulos de usar métodos condenáveis para evitar investigação da banda podre da administração federal. A retirada de assinaturas para esvaziar a criação da CPI da Corrupção, em 2001, é um belo exemplo. O arrastão de favores para livrar o governo de qualquer constrangimento ficou como um dos mais baixos momentos de um presidente eleito e reeleito pela ansiedade ética na vida brasileira.

Fernando Henrique liberou por bravata os parlamentares de sua base política para subscrever a CPI e, na hora H, liberou verbas estocadas e fez nomeações para cargos públicos. Junto com ACM e José Roberto Arruda, FHC afrontou o sentimento ético da cidadania falando em “linchamento precipitado" quando sua posição anterior incentivava a punição exemplar e imediata. E onde estava José Serra em meio a tudo isso? No Ministério da Saúde, definindo a criação da CPI como uma “brincadeira"," pretexto eleitoral", " instrumento para prejudicar a governabilidade.”

Em sua campanha, o tucano terá que se confrontar com questões sobre ética e economia. Mas com muita cautela, evitando o reaparecimento de fantasmas incômodos. Eles podem dizer que foi naquela época, e não hoje, que “para muita gente Deus morreu". Um deus imanente, amoral e, tal como os dirigentes aboletados no Estado, servil ao mercado que o pagou.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Cuba não teme a mentira

Companheiras e companheiros, delegados e convidados:

Tivemos um bom Congresso, que realmente começou no mês de Outubro do ano passado com as reuniões abertas nas quais participaram centenas de milhares de jovens, continuou com as assembleias de balanço das organizações de base e dos comités municipais e provinciais, onde se foram conformando os acordos adoptados nestas sessões finais.
Se alguma coisa abundou nos pouco mais de cinco anos transcorridos desde que Fidel proferiu o discurso de encerramento do VIII Congresso da UJC, no dia 5 de Dezembro de 2004, foi o trabalho e os desafios.
Realizamos este Congresso no meio de uma das mais ferozes e concertadas campanhas mediáticas contra a Revolução Cubana nos seus 50 anos de existência, tema ao qual terei que fazer referência mais para frente.
Apesar de que não poder participar nas assembleias prévias ao Congresso, fiquei a par de todas elas de maneira resumida. Sei que se falou pouco de resultados para se concentrarem nos problemas, olhando para dentro e sem utilizar mais tempo do que verdadeiramente é necessário para avaliar os factores externos. É o estilo que deve sempre caracterizar o trabalho da UJC, perante aqueles que se dedicam a procurar a palha no olho do vizinho em vez de empregarem esse esforço em fazer o que lhes corresponde.
Foi gratificante escutar muitos jovens dedicados à produção que explicaram, com orgulho e palavras simples, o trabalho que realizam sem mencionar dificuldades materiais e os obstáculos burocráticos que os afectam.
Muitas das deficiências analisadas não são novas, acompanham a organização há muito tempo, sobre elas os congressos anteriores aprovaram as decisões correspondentes e contudo reiteram-se em maior ou menor medida, o que demonstra a insuficiente sistematização e rigor no controlo do seu cumprimento.
Neste sentido é justo e necessário repetir algo no qual insistiram os companheiros Machado e Lazo, que presidiram numerosas assembleias: o Partido também se sente responsável por cada deficiência do trabalho da UJC, muito especialmente nos problemas e na política de quadros.
Não devemos permitir que, mais uma vez, os documentos aprovados se tornem letra morta e sejam engavetados, como se fossem uma recordação. Devem constituir o guia para a acção quotidiana no nível do Bureau Nacional e de cada militante. O fundamental já foi por vós acordado, agora resta trabalhar.
Alguns são muito críticos quando se referem à juventude de hoje e esquecem que eles também foram jovens. Seria ilusório pretender que as novas gerações fossem iguais às de épocas passadas, um sábio provérbio diz: os homens têm mais a ver com seu tempo do que com os seus pais.
Os jovens cubanos estão sempre dispostos a enfrentarem os desafios, como o demonstraram na recuperação dos danos causados pelos furacões, no enfrentar as provocações do inimigo e nas tarefas da defesa, e poderia mencionar muito mais.
A idade média dos delegados ao Congresso é de 28 anos, portanto, todos cresceram nestes duros anos do período especial e foram participantes dos esforços de nosso povo para manter as conquistas principais do socialismo no meio de uma situação económica muito complexa.
Precisamente pela importância de que a vanguarda da juventude esteja a par da nossa realidade económica, a Comissão do Bureau Político, tendo em consideração a positiva experiência da análise realizada a esse respeito com os Deputados da Assembleia Nacional, aprovou dar às assembleias municipais da UJC uma informação que descreve, sem disfarce, a situação actual e as perspectivas nesta matéria, que foi recebida por mais de 30 mil jovens militantes, bem como aos principais dirigentes partidários, às organizações populares e aos governos nos seus diferentes níveis.
A batalha económica constitui hoje, mais do que nunca, a tarefa principal e o centro do trabalho ideológico dos quadros, porque dela depende a sustentação e preservação do nosso sistema social.
Sem uma economia sólida e dinâmica, se não são eliminados os gastos supérfluos e o esbanjamento, não se poderá avançar na elevação do nível de vida da população, nem será possível manter e melhorar os elevados níveis já atingidos na educação e na saúde, garantidos gratuitamente a todos os cidadãos.
Sem uma agricultura forte e eficiente, que podemos desenvolver com os recursos que temos sem sonhar com as grandes verbas de outros tempos, não podemos aspirar a sustentar e elevar a alimentação da população, que ainda depende muito da importação de produtos que podem ser cultivados em Cuba.
Enquanto as pessoas não sentirem a necessidade de trabalhar para viver, amparadas nas regulamentações estatais excessivamente paternalistas e irracionais jamais estimularemos o amor pelo trabalho, nem daremos solução à falta crónica de construtores, operários agrícolas e industriais, professores, policias e outras profissões indispensáveis que vão desaparecendo aos poucos.
Sem a firme e sistemática rejeição social das ilegalidades e diversas manifestações de corrupção, não poucos continuarão a enriquecer a custa do suor da maioria, disseminando atitudes que atacam directamente a essência do socialismo.
Se mantemos vagas exageradas em quase todos os âmbitos dos afazeres nacionais e pagamos salários que não se correspondem com os resultados, elevando o volume de dinheiro em circulação, não podemos esperar que os preços detenham o seu aumento constante, deteriorando a capacidade aquisitiva do povo. Sabemos que há centenas de milhares de trabalhadores a mais nos sectores orçamentado e empresarial, alguns analistas calculam que o excesso de vagas ultrapassa o milhão de pessoas, mas este é um assunto muito sensível que temos o dever de enfrentar com firmeza e sentido político.
A Revolução não deixará ninguém desamparado, lutará por criar as condições para que todos os cubanos tenham empregos dignos, mas não se trata de o Estado se encarregar de colocar cada um depois nas várias ofertas de trabalho. Os primeiros interessados em encontrar um trabalho socialmente útil devem ser os próprios cidadãos.
Resumindo, continuar a gastar por cima das receitas significa simplesmente comermos o futuro e pôr em risco a própria sobrevivência da Revolução.
Enfrentamo-nos perante realidades nada agradáveis, mas não fechamos os olhos perante elas. Estamos certos que há que romper dogmas e assumirmos com firmeza e confiança a actualização, já em curso, do nosso modelo económico, com o propósito de criar as bases da irreversibilidade e o desenvolvimento do socialismo cubano, que sabemos constitui a garantia da independência e da soberania nacional.
Não ignoro que alguns companheiros às vezes desesperam, desejando mudanças imediatas em múltiplas esferas. Naturalmente refiro-me agora àqueles que o fazem sem a intenção de fazer o jogo do inimigo. Compreendemos essas inquietações que na generalidade têm a sua origem no desconhecimento da magnitude da tarefa que temos pela frente, da profundidade e da complexidade das inter-relações entre os diferentes factores do funcionamento da sociedade que deverão ser modificadas.
Aqueles que pedem para se avançar mais rápido, devem ter em conta o rosário de assuntos que estamos a estudar, dos quais hoje só lhes mencionei alguns. Devemos evitar que por ter pressa ou por improvisar, tentando solucionar um problema, provoquemos um outro ainda maior. Em assuntos de envergadura estratégica para a vida de toda a nação não podemos deixar-nos levar por emoções e actuar sem a integralidade necessária. Essa é, como já explicámos, a única razão pela qual decidimos adiar por mais alguns meses a realização do Congresso do Partido e a Conferência Nacional que o precederá.
Este é o maior e mais importante desafio que temos para garantir a continuidade da obra construída nestes 50 anos, que a nossa juventude assumiu com total responsabilidade e convicção. A palavra de ordem que preside este Congresso é: “Tudo pela Revolução” e isso significa, em primeiro lugar, fortalecer e consolidar a economia nacional.
Cabe à juventude cubana assumir o lugar da geração fundadora da Revolução e para conduzir a grande força das grandes maiorias precisa de uma vanguarda que convença e mobilize, a partir da autoridade que emana do exemplo pessoal, encabeçada por dirigentes firmes, capazes e prestigiados, verdadeiros líderes, não improvisados, que tenham passado pela insubstituível forja da classe operária, em cujo seio são cultivados os valores mais genuínos de um revolucionário. A vida tem-nos demonstrado com eloquência como é perigoso de violar esse princípio.
Fidel expressou-o claramente no encerramento do Segundo Congresso da UJC, no dia 4 de Abril de 1972: cito:
“Ninguém aprenderá a nadar em terra, e ninguém caminhará sobre o mar. O homem é feito pelo seu meio ambiente, o homem é feito pela sua própria vida, pela sua própria actividade”. E concluiu:
“Aprenderemos a respeitar o que é criado pelo trabalho, criando. Ensinaremos a respeitar esses bens, ensinando a criar esses bens.”
Esta ideia, proferida há 38 anos e que certamente foi aclamada naquele congresso, é mais um exemplo evidente dos assuntos que decidimos e que depois não cumprimos.
Hoje, mais do que nunca precisam-se quadros capazes de levar a cabo um trabalho ideológico efectivo, que não pode ser diálogo de surdos nem a repetição mecânica de palavras de ordem; dirigentes que raciocinem com argumentos sólidos, sem se julgarem os donos absolutos da verdade; que saibam escutar, embora não agrade o que alguns digam; que avaliem com mente aberta os critérios dos outros, o que não exclui rebater com fundamentos e energia os que forem inaceitáveis.
Fomentar a discussão franca e não ver na discordância um problema, mas sim uma fonte de melhores soluções. A unanimidade absoluta geralmente é fictícia e por conseguinte daninha. A contradição, quando não for antagónica como é o nosso caso, é motor do desenvolvimento. Devemos suprimir, com toda a intencionalidade, tudo o que alimente a simulação e o oportunismo. Aprender a uniformizar as opiniões, estimular a unidade e fortalecer a direcção colectiva, são características que devem identificar os futuros dirigentes da Revolução.
Em todo o país existem jovens com atitude e capacidade necessárias para assumirem tarefas de direcção. O desafio é descobri-los, prepará-los e dar-lhes vagarosamente maiores responsabilidades. As grandes maiorias encarregar-se-ão de confirmar que a selecção foi correcta.
Apreciamos que se continua a avançar na composição étnica e de género. É uma direcção na qual não podemos permitir retrocessos nem superficialidades e na qual a UJC deve trabalhar de maneira permanente. A propósito, sublinho que é outra das decisões que aprovámos, neste caso há 35 anos, no Primeiro Congresso do Partido, e cujo cumprimento deixámos à geração espontânea e não controlámos como deviamos, sendo este, além disso, um dos primeiros pronunciamentos de Fidel em reiteradas ocasiões, desde o triunfo da Revolução.
Como lhes dizia no início, a realização deste Congresso coincidiu com uma descomunal campanha de descrédito contra Cuba, organizada, dirigida e financiada a partir dos centros do poder imperial nos Estados Unidos da América e na Europa, desfraldando hipocritamente as bandeiras dos direitos humanos.
Manipulou-se, com cinismo e desfaçatez, a morte de um indivíduo condenado à privação de liberdade em 14 julgamentos de delito comum, transformado por obra e graça da mentira repetida e do afã de receber apoio económico do exterior em “dissidente político”, que foi incentivado a manter uma greve de fome com exigências absurdas.
Apesar dos esforços de nossos médicos morreu, o que também lamentámos na altura, e denunciámos os únicos beneficiários deste facto, os mesmos que hoje incentivam outro indivíduo a que continue uma atitude idêntica de chantagem inaceitável. Este último, apesar de tanta calúnia, não está preso, é uma pessoa em liberdade que cumpriu condenações por delitos comuns, especificamente por ter agredido e ferido uma mulher, médica e directora de um hospital, a quem também ameaçou de morte, e depois a uma outra pessoa, uma idosa de quase 70 anos, a quem tiveram que cortar o baço. Tal como no caso anterior, estão a fazer-se tudo o que á possível por lhe salvar a vida, porém se não muda sua atitude de autodestruição, será responsável, juntamente com seus patrocinadores, pelo desenlace que também não desejamos.
É repugnante a dupla moral dos que na Europa guardam um silêncio cúmplice perante as torturas na chamada guerra contra o terrorismo, permitiram voos clandestinos da CIA que trasladavam prisioneiros e até cederam os seus territórios para a criação de prisões secretas.
O que é que diriam se tal como eles, tivéssemos violado as normas éticas e alimentássemos pela força estas pessoas, como se tem feito habitualmente, entre muitos outros centros de tortura, na Base Naval de Guantánamo. E certamente, são os mesmos que nos seus próprios países, como é mostrado pela televisão quase diariamente, usam as forças policiais montadas a cavalo contra manifestantes, espancando-os e disparando contra eles gases lacrimogéneos, e até balas. O que dizer dos frequentes maus-tratos e humilhações aos quais são submetidos os imigrantes?
A grande imprensa ocidental não só ataca Cuba, como também estreou uma nova modalidade de implacável terror mediático contra os líderes políticos, intelectuais, artistas e outras personalidades que em todo o planeta levantam sua voz contra a falácia e a hipocrisia e simplesmente avaliam os acontecimentos de maneira objectiva.
Enquanto isso, poderia parecer que os porta-bandeiras da cacarejada liberdade de imprensa esqueceram que o bloqueio económico e comercial contra Cuba e todos seus inumanos efeitos sobre o nosso povo, mantêm plena vigência e recrudescem; que a actual administração dos Estados Unidos da América não cessa o apoio à subversão; que a injusta, discriminatória e ingerencista posição comum da União Europeia, patrocinada na altura pelo governo norte-americano e pela extrema-direita espanhola, continua a reclamar uma mudança de regime em nosso país, ou dito de outra maneira, a destruição da Revolução.
Mais de meio século de combate permanente ensinou o nosso povo que a hesitação é sinónimo de derrota.
Custe o que custar, jamais cederemos à chantagem de nenhum país ou conjunto de nações por mais poderosas que sejam. Temos o direito a nos defender.
Saibam que se pretendem encurralar-nos, saberemos resguardar-nos na verdade e nos princípios. Mais uma vez seremos firmes, calmos e pacientes. Sobram os exemplos na nossa história!
Foi assim que lutaram nossos heróicos mambises nas guerras pela independência no século XIX.
Foi assim que derrotámos a última ofensiva de dez mil soldados da tirania fortemente armados, enfrentados inicialmente por apenas 200 combatentes rebeldes que sob o comando directo do Comandante-em-Chefe Fidel Castro Ruz, durante 75 dias, de 24 de Maio a 6 de Agosto de 1958, levaram a cabo mais de 100 acções combativas, incluíndo quatro batalhas num pequeno território, entre 650 e 700 quilómetros quadrados, isto é, uma área menor do que a ocupada pela Cidade de Havana. Esta grande Operação decidiu o curso da guerra e após pouco mais de quatro meses triunfou a Revolução, o que motivou o Comandante Ernesto Che Guevara a escrever em seu diário de campanha: “O exército batistiano saiu com sua espinha dorsal quebrada desta última ofensiva sobre a Sierra Maestra”.
Tampouco nos amedrontou a frota ianque em frente das costas da Baia dos Porcos, em 1961. Nos seus próprios narizes aniquilámos o seu exército mercenário, no que constituiu a primeira derrota de uma aventura militar dos Estados Unidos da América neste continente.
Fizemo-lo novamente em 1962 durante a Crise de Outubro. Não cedemos nem um milímetro perante as brutais ameaças de um inimigo que nos apontava com as suas armas nucleares e se dispunha a invadir a ilha, nem sequer o fizemos quando, negociadas às nossas costas as condições para solucionar a crise, os dirigentes da União Soviética, o principal aliado em tão difícil conjuntura e de cujo apoio dependia a sorte da Revolução, de maneira respeitosa tentaram convencer-nos para que aceitássemos a inspecção no solo pátrio da retirada do seu armamento nuclear e lhes respondemos que em qualquer o caso ela seria feito a bordo dos seus navios em águas internacionais, mas jamais em Cuba.
Estamos certos que circunstâncias piores do que aquelas dificilmente possam ser repetidas.
Já mais recentemente, o povo cubano deu uma amostra inesquecível da sua capacidade de resistência e confiança em si próprio quando, em consequência do desaparecimento do campo socialista e da desintegração da União Soviética, Cuba sofreu uma baixa de 35 por cento do seu Produto Interno Bruto; uma redução do comércio externo de 85 por cento; a perda dos mercados das suas principais exportações como o açúcar, o níquel, os citrinos e outros, cujos preços desceram para metade; o desaparecimento de créditos em condições favoráveis com a consequente interrupção de numerosos investimentos vitais como a primeira Central nuclear e a Refinaria de Cienfuegos, o colapso dos transportes, das construções e da agricultura ao desaparecer subitamente o fornecimento de peças de reposição para a técnica, os fertilizantes, as rações e as matérias-primas das indústrias, provocando a paragem de centenas e centenas de fábricas e a abrupta deterioração quantitativa e qualitativa da alimentação do nosso povo até níveis abaixo da nutrição recomendada. Todos sofremos aqueles calorosos Verões da primeira metade da década de 90 do século passado com faltas de energia superiores a 12 horas diárias por falta de combustível para gerar electricidade, e enquanto tudo isso acontecia, dezenas de agências de imprensa ocidentais, algumas delas sem dissimular a sua euforia, enviavam correspondentes a Cuba com a intenção de serem as primeiras em reportarem a derrota definitiva da Revolução.
No meio desta dramática situação, ninguém ficou abandonado a sua sorte e ficou evidenciado a força que emana da unidade do povo quando são defendidas ideias justas e uma obra construída com tanto sacrifício. Só um regime socialista, apesar das suas deficiências, é capaz de superar tamanha prova.
Portanto não nos tiram o sono as actuais escaramuças da ofensiva da reacção internacional, coordenada como sempre por aqueles que não se resignam a compreenderem que este país jamais será subjugado por uma via ou por outra, antes prefere desaparecer como o demonstramos em 1962.
Há apenas 142 anos, no dia 10 de Outubro de 1868, começou esta Revolução, nessa altura lutava-se contra um colonialismo europeu decadente, sempre sob o boicote do nascente imperialismo norte-americano que não desejava nossa independência, mas esperava que a “fruta madura” caísse por “gravidade geográfica” nas suas mãos. Desse modo aconteceu após mais de 30 anos de guerras e enormes sacrifícios do povo cubano.
Agora os actores externos trocaram os seus papéis. Há mais de meio século que nos agride e assedia constantemente o já moderno e mais poderoso império do planeta, valendo-se no boicote que entranha a ultrajante Posição Comum, que se mantém intacta graças às agressões de alguns países e das forças políticas reaccionárias da União Europeia com diversos e inaceitáveis condicionamentos.
Perguntamo-nos, porquê? E consideramos que simplesmente porque na essência os actores continuam a ser os mesmos e não renunciam às suas velhas aspirações de dominação.
Os jovens revolucionários cubanos compreendem perfeitamente que para preservar a Revolução e o socialismo e continuar a ser dignos e livres têm daqui em diante muitos anos mais de luta e de sacrifícios.
Ao mesmo tempo, pairam sobre a humanidade colossais desafios e cabe, em primeiro lugar, aos jovens enfrentá-los. Trata-se de defender a própria sobrevivência da espécie humana, ameaçada como nunca perante a mudança climática, que se acelera pelos padrões irracionais de produção e consumo que engendra o capitalismo.
Hoje, somos sete mil milhões de habitantes no planeta. Metade deles são pobres, mil e vinte milhões têm fome. Cabe perguntar-se que acontecerá no ano 2050, quando a população mundial atinjir os nove mil milhões e as condições de existência na Terra se tenham deteriorado ainda mais.
A farsa em que concluiu a última cimeira na capital de Dinamarca, em Dezembro do ano passado, demonstra que o capitalismo com as suas cegas leis de mercado jamais resolverá esse e muitos outros problemas. Só a consciência e a mobilização dos povos, a vontade política dos governos e o avanço do conhecimento científico e tecnológico poderão impedir a extinção do homem.
Para finalizar gostaria de referir que no mês de Abril do próximo ano completar-se-á meio século da proclamação do carácter socialista da Revolução e da vitória esmagadora sobre a invasão mercenária na Baia dos Porcos. Celebraremos estes transcendentais acontecimentos em todos os cantos do país, de Baracoa onde tentaram desembarcar um batalhão, até ao extremo ocidental da nação, e na capital realizaremos um grande desfile popular e uma revista militar, actividades nas quais trabalhadores, intelectuais e jovens serão os principais protagonistas.
Daqui a poucos dias, no Primeiro de Maio, nosso povo revolucionário, em todo o país, nas ruas e praças públicas que por direito lhe pertencem, dará mais outra contundente resposta a esta nova escalada internacional de agressões.
Cuba não teme à mentira nem se ajoelha perante pressões, condicionamentos ou imposições, venham donde vierem, defende-se com a verdade, que sempre, mais cedo do que tarde, se impõe.
Um dia como hoje, há 48 anos, nasceu a União de Jovens Comunistas. Naquele histórico 4 de Abril de 1962 Fidel asseverou:
“Acreditar nos jovens é ver neles além do entusiasmo, capacidade; além da energia, responsabilidade; além da juventude, pureza, heroísmo, carácter, vontade, amor à pátria, fé na pátria!, amor à Revolução!, fé na Revolução, confiança em si próprios!, convicção profunda de que a juventude pode, de que a juventude é capaz, convicção profunda de que sobre os ombros da juventude podem ser depositadas grandes tarefas”, concluiu.
Assim foi ontem, é hoje e continuará a ser no futuro.
Muito obrigado.

* Discurso proferido por Raúl Castro Ruz, Presidente dos Conselhos de Estado e Ministros e Segundo Secretário do Partido Comunista de Cuba, no encerramento do Congresso da União de Jovens Comunistas (UJC), em 4 de Abril de 2010

O império manda, as colônias obedecem

Após a Segunda Guerra Mundial, quando as forças aliadas saíram vitoriosas, o governo dos EUA tentou tirar o máximo proveito de sua vitória militar. Articulou a Assembléia das Nações Unidas dirigida por um Conselho de Segurança integrado pelos sete países mais poderosos, com poder de veto sobre as decisões dos demais.

Impôs o dólar como moeda internacional, submeteu a Europa ao Marshall, de subordinação econômica, e instalou mais de 300 bases militares na Europa e na Ásia, cujos governos e mídia jamais levantam a voz contra essa intervenção branca.

O mundo inteiro só não se curvou à Casa Branca porque existia a União Soviética para equilibrar a correlação de forças. Contra ela, os EUA travaram uma guerra sem limites, até derrotá-la política, militar e ideologicamente.

A partir da década de 90, o mundo ficou sob hegemonia total do governo e do capital estadunidenses, que passaram a impor suas decisões a todos os governos e povos, tratados como vassalos coloniais.

Quando tudo parecia calmo no império global, dominado pelo Tio Sam, eis que surgem resistências. Na América Latina, além de Cuba, outros povos elegem governos antiimperialistas. No Oriente Médio, os EUA tiveram que apelar para invasões militares a fim de manter o controle sobre o petróleo, sacrificando milhares de vidas de afegãos, iraquianos, palestinos e paquistaneses.

Nesse contexto surge no Irã um governo decidido a não se submeter aos interesses dos EUA. Dentro de sua política de desenvolvimento nacional, instala usinas nucleares e isso é intolerável para o Império.

A Casa Branca não aceita democracia entre os povos. Que significa todos os países terem direitos iguais. Não aceita a soberania nacional de outros povos. Não admite que cada povo e respectivo governo controlem s eus recursos naturais.

Os EUA transferiram tecnologia nuclear para o Paquistão e Israel, que hoje possuem bomba atômica. Mas não toleram o acesso do Irã à tecnologia nuclear, mesmo para fins pacíficos. Por quê? De onde derivam tais poderes imperiais? De alguma convenção internacional? Não, apenas de sua prepotência militar.

Em Israel, há mais de vinte anos, Moshai Va nunu, que trabalhava na usina atômica, preocupado com a insegurança que isso representa para toda a região, denunciou que o governo já tinha a bomba. Resultado: foi sequestrado e condenado à prisão perpetua, comutada para 20 anos, depois de grande pressão internacional. Até hoje vive em prisão domiciliar, proibido de contato com qualquer estrangeiro.

Todos somos contra o armamento militar e bases militares estrangeiras em nossos países. Somos contrários ao uso da energia nuclear, devido aos altos riscos, e ao uso abusivo de tantos recursos econômicos em gastos militares.

O governo do Irã ousa defender sua soberania. O governo usamericano só não invadiu militarmente o Irã porque este tem 60 milhões de habitantes, é uma potência petrolífera e possui um governo nacionalista. As condições são muito diferentes do atoleiro chamado Iraque.

Felizmente, a diplomacia brasileira e de outros governos se envolveu na contenda. Esperamos que sejam respeitados os direitos do Irã, como de qualquer outro país, sem ameaças militares.

Resta-nos torcer para que aumentem as campanhas, em todo mundo, pelo desarmamento militar e nuclear. Oxalá o quanto antes se destinem os recursos de gastos militares para solucionar problemas como a fome, que atinge mais de um bilhão de pessoas.

Os movimentos sociais, ambientalistas, igrejas e entidades internacionais se reuniram recentemente em Cochabamba, numa conferência eco lógica mundial, convocada pelo presidente Evo Morales. Decidiu-se preparar um plebiscito mundial, em abril de 2011. As pessoas serão convocadas a refletir e votar se concordam com a existência de bases militares estrangeiras em seus países; com os excessivos gastos militares e que os países do Hemisfério Sul continuem pagando a conta das agressões ao meio ambiente praticadas pelas indústrias poluidoras do Norte.

A luta será longa, mas nessa semana podemos comemorar uma pequena vitória antiimperialista.

*Por Frei Betto e João Pedro Stedile

Frei Betto é escritor e João Pedro Stedile integra a direção da Via Campesina

segunda-feira, 17 de maio de 2010

O povo da Grécia Luta pela Humanidade

*Miguel Urbano Rodrigues

Neste artigo Miguel Urbano Rodrigues chama a atenção para o agravamento da crise mundial do capitalismo. A dívida externa dos EUA, a maior do mundo, ultrapassa já o PIB do país e continua a aumentar. Obama, negando compromissos assumidos, nomeou para postos chave da Administração alguns dos principais responsáveis pela crise financeira. Numa segunda parte, reflecte sobre os acontecimentos da Grécia, sublinhando que nestas semanas o povo grego luta pela humanidade inteira num combate em que o Partido Comunista da Grécia se assume como vanguarda revolucionária da classe operária, na melhor tradição leninista.


As gigantescas manifestações de protesto do povo grego contra a política do Governo do Partido Socialista e as medidas impostas ao país pela União Europeia e o FMI iluminam nestes dias a amplitude e complexidade de uma crise sem precedentes.

A grande maioria da Humanidade não tomou ainda consciência de que o seu futuro é inseparável da luta de classes em desenvolvimento na terra que foi berço da civilização europeia e do conceito de democracia política.

Um sistema mediático controlado pelo imperialismo insiste em apresentar os acontecimentos da Grécia como episódio de uma crise financeira mundial prestes a ser superada.

Trata-se de uma inverdade. A Humanidade enfrenta uma crise global e estrutural do capitalismo que se agrava a cada semana nas frentes económica, financeira, cultural, energética, ambiental, militar, social e politica.


O MITO OBAMA


A crise iniciou-se nos EUA, o principal baluarte do imperialismo. A potência que os media portugueses insistem em apresentar como «a maior economia do mundo» entrou num processo de decadência irreversível. Os EUA são hoje o país mais endividado do mundo. A sua dívida externa no final de 2008 atingia 13,77 milhões de milhões de dólares, o equivalente ao PIB do país; actualmente já o excede. É actualmente superior a todas as dívidas externas somadas da Europa, Ásia, África e América Latina. Uma divida impagável, anunciadora de um estouro que abalará o mundo. Por si só, a China é possuidora de mais de 900 mil milhões de dólares em reservas de dólares e títulos do Tesouro norte-americano.

Por que se mantém então a hegemonia dos EUA?

Dois factores a garantem. O primeiro é o seu imenso poderio militar. O outro a permanência do dólar como moeda de referência no comércio internacional, nomeadamente a divisa utilizada nas transacções do petróleo. E não há controlo para a emissão do bilhete verde.

Mas como os EUA se transformaram numa sociedade parasitária que consome muito mais do que produz, o país avança para um desastre, sem data no calendário, de proporções colossais.

O gigante tem pés de barro. O seu deficit comercial ultrapassou um milhão de milhões de dólares no ano passado. Este ano será superior.

Como a acumulação capitalista não funciona mais de acordo com a lógica do sistema, Washington, na fidelidade a uma estratégia de dominação universal, saqueia os recursos naturais de dezenas de países e desencadeia guerras de agressão ditas «preventivas» com a cumplicidade dos seus aliados da União Europeia.

Neste contexto o presidente Barack Obama, apresentado pela propaganda como político progressista e humanista, desenvolve uma politica que é indispensável e urgente desmistificar porque configura uma ameaça à Humanidade.

A falsificação da História não pode apagar a realidade. O homem distinguido com o Nobel da Paz ampliou a politica belicista de Bush. Manteve a ocupação do Iraque, intensificou a guerra de agressão no Afeganistão, iniciou os bombardeamentos no Noroeste do Paquistão, mantém a aliança com o sionismo neofascista israelense.

Crimes monstruosos, sobretudo no Afeganistão, comparáveis aos das SS nazis na II Guerra Mundial, são cometidos rotineiramente pelas Forças Armadas dos EUA. A barbárie militar tem aliás por complemento uma vaga de barbárie cultural. Essa é porém assunto a que os grandes media dedicam atenção mínima. Seria incómodo lembrar a destruição e saque de patrimónios da Humanidade na antiga Mesopotâmia. Informar por exemplo que nas ruínas de Babilónia estacionam tanques da US ARMY, que a maior base americana no Afeganistão, Begram, está instalada no espaço arqueológico de Kapisa, a antiga capital da desaparecida civilização Kuchana.

O Nobel da Paz dos EUA é o primeiro responsável pelo golpe de Estado nas Honduras (ver odiario.info de 26 de Julho e 1 de Dezembro de 2009), retoma a política de hostilidade à Revolução Cubana, volta a enviar a IV Esquadra para águas da América Latina, ameaça a Venezuela Bolivariana, o Equador e a Bolívia, cria 7 novas bases militares norte-americanas na Colômbia, instala em África o AFRICOM, um exército permanente dos EUA naquele Continente, bombardeia a Somália e o Iémen.

O presidente dos EUA é elogiado como defensor de um mundo sem armas nucleares. Mas na recente Conferência sobre Desnuclearização ameaçou usá-las contra o Irã, se o seu governo não se submeter às exigências de Washington.

A CUMPLICIDADE COM A FINANÇA

Diariamente lemos nos jornais portugueses e ouvimos em programas televisivos em que pontificam politólogos do sistema que a recessão terminou na maioria dos países da União Europeia, que a retomada é uma realidade e que nos EUA a economia cresceu no último trimestre mais do que o previsto. A Grécia, Portugal, a Espanha, a Irlanda e a Itália seriam excepções. A «turbulência» dos mercados mantinha-se, com bruscas oscilações nas bolsas, mas isso resultaria da acção de especuladores.

Os governantes e a comunicação social esforçam-se por persuadir os povos de que tudo voltará em breve à normalidade graças a sábias políticas financeiras - insinua-se - que salvaram a banca e a medidas de austeridade impostas pela necessidade de reduzir os deficits orçamentais. Em Portugal, o PEC seria a solução salvadora. Com custos, é um facto, mas a hora exigiria sacrifícios de «todos» a bem da pátria.

O discurso da mentira e da hipocrisia pode mudar na forma, mas o seu conteúdo é fundamentalmente o mesmo de Washington a Paris, de Tóquio a Londres.

O objectivo é enganar os povos para impedir que a intensificação das lutas sociais abale as bases do sistema.

Uma vez mais são os EUA quem comanda a campanha de desinformação.

Na realidade, muito pouca coisa mudou ali no mundo corrupto da finança. Centenas de milhões de dólares foram injectadas no «mercado» pela Administração Obama, mas não para acudir às grandes vítimas da crise, as camadas mais pobres do povo norte-americano. As medidas tomadas pelo Governo Federal visaram salvar da falência os responsáveis pelas acções criminosas que desencadearam a crise, sobretudo a grande banca, as seguradoras, os gigantes da indústria automóvel.

Os patrões da finança são os mesmos e continuam a atribuir-se salários e prémios milionários (em Portugal acontece o mesmo) e retomam os métodos fraudulentos que estão na origem do tsunami financeiro.

Prémios Nobel da Economia como Joseph Stiglitz, Paul Krugman e académicos de prestígio mundial como Noam Chomsky arrancam a máscara ao governo federal, desmontando a mentira da recuperação. Acusam frontalmente Obama de, ao invés de punir os cardeais da finança ter colocado muitos deles em postos chave da Administração. É o caso do secretário do Tesouro, Timothy Geithner, um ex-magnata de Wall Street, hoje responsável pela política monetária do país. Mais expressivo ainda é o caso de Larry Summers. Esse homem foi, durante o governo de Clinton o autor intelectual da revogação da lei que impedia a chamada «desregulamentação», isto é as politica criminosas que provocaram falências em cadeia. Que fez Obama? Nomeou-o seu assessor económico.

Em 1929, no auge da crise iniciada com o crash de Wall Street, John Kenneth Galbraith, o eminente economista liberal afirmou que «o sentido de responsabilidade da comunidade financeira perante a sociedade (…) é praticamente nulo».

Nada mudou desde então.

Obama comprometeu-se a reformar profundamente o sistema financeiro. Mas, em vez de cumprir a promessa, manteve os privilégios dos cardeais da finança.

O desemprego, entretanto, cresce. A pobreza alastra em cidades como Detroit (antes pulmão da indústria automobilística) e Pittsburg (antiga capital do aço) onde bairros inteiros, desabitados, oferecem uma imagem de decadência que nega os slogans do american way of life.

A chanceler Merkel e o presidente Sarkozy bradam que «é preciso refundar o capitalismo». Mas, conscientes de que o capitalismo não é humanizável, tudo fazem para o recauchutar.

O EXEMPLO DA GRÉCIA

Foi ilusório acreditar que a Europa escaparia aos efeitos da crise nos EUA.

Sucedem-se as crises na Islândia, na Espanha, na Irlanda, em Portugal, na Grécia.

O euro desvaloriza-se em ritmo alarmante. A taxa de desemprego atinge já os 20% em Espanha. Na Alemanha e na Grã-Bretanha a gravidade da crise será transparente após as eleições. Em França, Sarkozy tenta em vão ocultar o profundo descontentamento do povo que se expressa na amplitude assumida pela contestação social.

Na Grécia a economia desmoronou-se. O alarme foi tamanho em Bruxelas que os grandes da União Europeia, temendo o contágio, aprovaram com o FMI, após tumultuosos debates, marcados por contradições e hesitações, um plano dito de «ajuda» que na realidade impõe ao país medidas que, a serem aplicadas, o reduziria à condição de colónia administrada pela finança internacional.

Subestimaram o espírito de luta do povo grego, a sua firmeza no combate em defesa de direitos históricos adquiridos há muitas décadas.

Sete greves gerais nos últimos cinco meses expressaram a recusa dos trabalhadores gregos a submeter-se ao chamado «programa de austeridade», eufemismo que encobre as exigências impostas pelo grande capital, violadoras da soberania nacional.

A greve do dia 5 de Maio, gigantesca, paralisou o país. Centenas de milhares de trabalhadores protestaram em Atenas e 68 outras cidades contra a agressão exterior mascarada de «ajuda».

Como era de esperar, os media internacionais desinformaram na Europa e nos EUA. Reduziram a dimensão do protesto e deturparam o significado da grande jornada de luta.

Mas o objectivo de caluniar o povo grego não foi atingido. Era impossível ocultar que o país parou. Transportes, escolas, hospitais, fábricas, portos, aeroportos, comércio; o sector privado juntou-se ao público.

Elementos da extrema direita provocaram distúrbios na manifestação em frente do Parlamento. Entre eles havia polícias à paisana. Mas a tentativa de responsabilizar o PAME - a Frente Sindical que mobilizou os trabalhadores - fracassou porque o protesto foi pacífico, excluindo todas as formas de violência.

Os governantes e banqueiros da UE insistem em falar do «caos grego», criticam os grevistas que se opõem a medidas de austeridade concebidas para «salvar o país». Mentem conscientemente. A Grécia projecta nestas semanas a imagem de uma luta de classes exemplar na qual o seu povo, no confronto com o capital, assume o papel de sujeito histórico. O mundo do trabalho não está disposto a pagar a factura da política capituladora que lhe é imposta, prevista aliás no Tratado de Maastricht: eliminação dos 13º e 14º salários, redução de pensões de reforma, corte brutal nos salários, congelamento dos mesmos, etc.

No dia 4 de Maio, reagindo à estratégia de Bruxelas, o Partido Comunista da Grécia (KKE), ocupou simbolicamente a Acrópole, em Atenas, e desfraldou naquela colina milenar bandeiras com uma inscrição desafiadora: «Povos da Europa levantai-vos!»

O KKE está consciente de que a Europa não se encontra no limiar de uma situação pré-revolucionária. Na própria Grécia não estão reunidas condições para um assalto ao poder.

Nem por isso o brado revolucionário do KKE é menos comovente e oportuno. Também em 1848 Marx sabia, quando redigiu com Engels o Manifesto do Partido Comunista, que a Revolução socialista na Europa não iria concretizar-se no futuro próximo. Mas o grito «Proletários de todos os países uni-vos!» ecoou no Continente como incentivo à luta de classes, desencadeando um vendaval de esperança nas massas oprimidas.

As grandes revoluções não se forjam em dias, sequer em meses ou anos. Não existe para elas data previsível porque resultam de uma soma de pequenas e grandes lutas inseridas em contextos históricos favoráveis.

Os comunistas gregos não ignoram que a derrota do capitalismo vai tardar. Mas adquiriram há muito a convicção inabalável de que deve ser frontal e sem concessões no combate ao sistema que invoca a necessidade de «reformas» e de «políticas de austeridade» para reforçar a opressão social.

Uma certeza: a crise, na Grécia e no mundo, vai agravar-se com pesado custo para o proletariado de novo tipo que engloba a nível planetário centenas de milhões de trabalhadores.

E não será dos Parlamentos transformados em instrumentos da dominação das classes dominantes que sairá a saída para a crise global que vivemos e ameaça a Humanidade.

Por isso mesmo, a exemplar lição de combatividade dos trabalhadores gregos e do seu heróico partido, vanguarda revolucionária na melhor tradição leninista, é tão importante, bela e simbólica.

Nesta Primavera europeia do ano 2010, os filhos da Grécia voltam a lutar pela Humanidade.



V.N.de Gaia, 9 de Maio de 2010

Fonte: O Diário.Info - http://www.odiario.info/?p=1592

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