domingo, 12 de julho de 2009
CORRUPÇÃO NÃO É DOENÇA
Recentemente o Diário da Manhã publicou uma matéria onde psicólogos e especialistas advogam a idéia de que haja um "transtorno psiquiátrico" ligado à corrupção.
Esse tipo de afirmação lança uma confusão sobre o que seja a doença mental. A natureza profunda desta última já foi muito bem estudada pela psiquiatria, aliás por profissionais bem mais compententes do que eu. Heni Ey, por exemplo, em seus "Études Psychiatriques", demonstra que onde há possibilidade de escolha não há doença mental.
O indivíduo normal pode escolher entre fazer ou não fazer o mal; já o doente mental perde esta "liberdade". O doente age ou impulsivamente, ou agressivamente, irracionalmente, sem planejamento, compulsivamente, prejudicando-se a si próprio com suas ações. É o contrário do que faz o corrupto, pois este planeja, calcula os riscos e benefícios, espera o momento certo, aufere lucros, evita prejudicar-se de todas as maneiras. Criminoso patológico, por exemplo, é aquele que furta uma bicicleta velha na porta da delegacia de polícia. É aquele que espanca as pessoas que o amam, é aquele que não controla os próprios impulsos, sendo
o primeiro a ser prejudicado por isto.
O corrupto, o político, é exatamente o contrário disto; o "espertinho" é a antítese disto. Só o temperamento pode adoecer e não o caráter, pois o temperamento é algo biológico, é algo que pode ser herdado, é algo que depende do cérebro, e a biologia adoece.
Mas o caráter é algo moral, o caráter é uma criação cultural-espiritual do homem e isto não adoece. Uma pessoa pode ter tido uma má orientação do pai, da mãe, da cultura do país, mas isto configura um desvio de caráter, não uma doença. O ato do mau-caráter envolve a completa possibilidade de decidir racionalmente e calmamente entre o bem e o mal. Se ele decide pelo mal isto não se dá por causa da impulsividade ou da compulsão, ele decide porque quer levar algum tipo de vantagem e calcula os riscos-benefícios para isto.
Como dizia Sartre, temos de arcar com a própria responsabilidade. Talvez tenha sido uma pesquisa que tenha confundido tudo isto ao mostrar que os corruptos adoecem mais de hipertensão, infarto, obesidade, úlcera péptica, etc. Tudo bem, isto pode ser correto, mas não é porque um comportamento gerou uma doença física que este comportamento, por si só, deve ser considerado como doença. Estes problemas físicos podem muito bem ser consequência do estresse pelo qual passa o corrupto ou o criminoso. Já é o "preço" que ele está pagando por ser dono da própria liberdade. A liberdade do homem normal envolve riscos e este é um deles.
*Marcelo Caixeta é psiquiatra
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