Até o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, ali compareceu e foi abraçado por Soros
Na exposição apresentada no III Encontro Civilização ou Barbárie, em Serpa, Portugal, Michel Chossudovsky reflete sobre aquilo que define como “a fabricação do consenso” e “a fabricação da dissidência”.Os dirigentes do sistema imperial compreenderam, após Seattle, que precisavam reformular a estratégia de resposta à vaga de protestos populares contra instituições como a OMC, a OCDE, o Banco Mundial e o FMI, instrumentos do imperialismo.
A “fabricação do consenso” – expressão divulgada por Chomsky – promovida pelas transnacionais que controlam a comunicação social, tem por objetivo desinformar e manipular as massas, levando-as a formar a opinião através do discurso da mentira.
A “fabricação da dissidência”, concebida pelas elites econômicas, é mais complexa. Para dificultar modalidades de protesto radicais, visa a promover e controlar formas de oposição que não ameacem o funcionamento do sistema. É exercido através da presença em movimentos progressistas de intelectuais e sindicalistas que condenam o neoliberalismo, mas não o capitalismo.
Uma oposição que acredita numa reforma do capitalismo que “o humanize” não é apenas tolerável, mas útil. Alguns desses intelectuais não têm consciência plena do papel que desempenham. Outros esforçam-se para impedir tomadas de posição anti-imperialistas e consensos orientados para ações internacionalistas.
Nesse contexto, a evolução do Fórum Social Mundial é esclarecedora.
Presentemente, muitos dos seus dirigentes tipificam o “reformador do capitalismo” inofensivo para o sistema. É o caso dos franceses Ignacio Ramonet e Bernard Cassen. Vale a pena recordar que, num dos fóruns, em Porto Alegre, Mario Soares – o coveiro da Revolução Portuguesa – foi o diretor do diário do evento. Uma chuva de parlamentares europeus e latinos contribuiu para estabelecer a confusão no FSM. Uma percentagem elevada das ONGs que participam activamente da contestação ao neoliberalismo está recheada de “informantes” a serviço de instituições capitalistas, incluindo a CIA. Tudo fazem para fragmentar o movimento popular.
Chossudovsky aborda uma realidade pouco conhecida: fundações privadas, com prestígio na chamada “sociedade civil”, atuam hoje nos bastidores como grupos de pressão, através de ativistas influentes, com renome internacional. São muitas, mas citarei apenas três gigantes: a Ford, a Rockefeller e a Stewart Mott.
Todas financiam generosamente movimentos de contestação. Os dirigentes de ONGS selecionadas não desconhecem a origem do dinheiro recebido, mas alegam que essas fundações são órgãos filantrópicos sem vínculos com o poder. As viagens aéreas e os hotéis de intelectuais progressistas respeitados são pagos por essas fundações.
Em outras palavras, o ativismo antiglobalização capitalista é, com frequência, segundo Chossudovsky, controlado por fundações a serviço da estratégia imperialista. Para demonstrar abertura democrática, líderes de organizações como a Green Peace, a Anistia Internacional e a Oxfam são convidados a participar do Fórum Econômico Mundial de Davos, a tribuna do grande capital. Até o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, ali compareceu e foi abraçado por Soros.
A resposta das forças progressistas à manipulação das consciências através da “fabricação do consenso” e da “fabricação da dissidência” está longe de ser satisfatória. A escassa presença de que dispõem na rede é mal aproveitada.
Revistas web de informação alternativa abrem as suas colunas a aventureiros da política, mascarados de revolucionários. Um charlatão como Heinz Dieterich, que chegou a sugerir a capitulação das Farc, foi, durante anos, recebido em Havana como amigo para, ultimamente. tomar distância e destilar veneno contra a Revolução Cubana.
Não faltam também intelectuais de “esquerda” que se contemplam como umbigo do mundo; alguns chegam ao extremo de promover homenagens a si próprios. A ampla divulgação pela mídia progressista do trabalho de Chossudovsky seria, creio, uma contribuição à luta contra o imperialismo.
Miguel Urbano Rodrigues é escritor português
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